Idoso que assinou pedido de demissão sem compreender o que estava fazendo deve ser indenizado
- A 4ª Turma do TRT-RS anulou o pedido de demissão de um operário celetista de um município e reconheceu que a dispensa foi discriminatória.
- O Município deverá pagar R$ 20 mil por danos morais, verbas rescisórias, remuneração em dobro entre a dispensa e o julgamento, aviso prévio proporcional, férias, 13º e multa de 40% do FGTS.
- O trabalhador é idoso, analfabeto funcional e tinha mais de 38 anos de serviço. Ele foi diagnosticado com insuficiência renal crônica e induzido a assinar documentos sem entender o conteúdo.
- O acórdão apontou vício de consentimento e ausência de justificativa plausível para a dispensa. Segundo a decisão, a doença grave e estigmatizante caracteriza despedida discriminatória pela Lei 9.029/95.
A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) reconheceu a nulidade do pedido de demissão apresentado por um operário contratado por município pelo regime celetista. O colegiado também declarou que a despedida teve caráter discriminatório.
O município empregador foi condenado a pagar indenização por danos morais de R$ 20 mil, verbas rescisórias, remuneração em dobro pelo período entre a dispensa e o julgamento, aviso prévio proporcional, férias proporcionais, gratificação natalina e indenização de 40% sobre o FGTS, com direito ao saque. O valor provisório abritrado à condenação é de R$ 120 mil.
A decisão unânime da Turma reformou a sentença do juízo da 1ª Vara do Trabalho de Rio Grande.
Segundo o processo, o trabalhador, idoso, analfabeto funcional e com mais de 38 anos de serviço, foi afastado em dezembro de 2022, pouco depois de ser diagnosticado com insuficiência renal crônica e iniciar tratamento de hemodiálise. Ele relatou que, em reunião convocada pela chefia, foi informado de que “não dava mais” para continuar no cargo e, em seguida, induzido a assinar documentos sem compreender seu conteúdo, acreditando tratar-se de uma dispensa por iniciativa do empregador.
O trabalhador alegou que a condição de saúde era de conhecimento da administração e que não tinha plena capacidade de leitura e compreensão do documento assinado. Sustentou que foi coagido a assinar um formulário-padrão já preenchido, o que configuraria vício de vontade, e que a despedida teve motivação discriminatória, amparando-se na Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
O município, por sua vez, defendeu que não houve discriminação e que o trabalhador pediu “exoneração” de forma voluntária, recebendo as verbas rescisórias devidas. Alegou que o ato foi válido e que não havia motivo para anulação ou indenização.
Em primeira instância, o juiz entendeu que o pedido de exoneração foi feito de forma consciente, sem indícios de coação, e julgou a ação improcedente. “Restou provado que o autor tinha total ciência de que estava apresentando pedido de exoneração e que este era irreversível”, afirmou o magistrado.
Já no julgamento do recurso, a relatora, desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse, destacou inicialmente que o operário era empregado público, não podendo se tratar de exoneração, embora o próprio processo administrativo utilize o termo "exoneração celetista".
De acordo com a magistrada, houve vício de consentimento e a despedida foi discriminatória, pois a doença do trabalhador se enquadra como grave e estigmatizante, nos termos da Lei 9.029/95, e o município não apresentou justificativa plausível para a rescisão. “A ausência de esclarecimentos adequados e o estado de hipossuficiência do trabalhador retiram a espontaneidade exigida para validade do ato”, destacou.
Também participaram do julgamento os desembargadores João Paulo Lucena e André Reverbel Fernandes, que acompanharam o voto da relatora. Cabe recurso do acórdão para o Tribunal Superior do Trabalho (TST).