"As normas de proteção trabalhista ainda são centradas no homem, com algumas concessões às mulheres”, afirma a juíza Noemia Porto
A desigualdade de gênero nas relações de trabalho foi o tema da palestra da juíza Noemia Porto, do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF), na sexta-feira (8/3), Dia Internacional da Mulher. A conferência integrou a programação da Aula Inaugural de 2024 da Escola Judicial do TRT-4, no Plenário do Tribunal.
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No início da exposição, a juíza observou que o Direito do Trabalho é resultado de uma luta histórica por melhores condições trabalhistas. Contudo, ressaltou que não há homogeneidade na figura do trabalhador. “As normas de proteção ainda são tratadas tendo como sujeito neutro o símbolo do proletariado masculino, fabril e provedor familiar. São centradas no homem, com algumas concessões às mulheres”, refletiu.
A magistrada defendeu, ao longo da palestra, que as trabalhadoras não podem ser tomadas pela linguagem e pela realidade do trabalhador homem. “O mercado de trabalho não é uma entidade sexualmente neutra, as relações de gênero estão na base da organização da esfera produtiva”. Ela ressaltou que não se pode separar a história do Direito do Trabalho da história das mulheres trabalhadoras. Citando as pesquisas da historiadora Gláucia Fraccaro, mencionou que a luta feminina já estava presente desde os primeiros movimentos trabalhistas brasileiros, no início do século passado. “As mulheres sempre foram solidárias nesses movimentos, mas não necessariamente compreendidas em sua totalidade nas demandas por igualdade”.
Socialização do cuidado
Conforme Noemia Porto, a divisão sexual do trabalho também expõe a desvalorização do trabalho doméstico e reprodutivo, que é desempenhado gratuitamente e sobretudo pelas mulheres. “Não há, de forma suficiente, a socialização do cuidado. Esse tema não é incorporado nos discursos de formatação das normas de adequação de proteção social das pessoas trabalhadoras”, observou. “Nós mulheres continuamos a ser o lugar, o assento e o território do cuidado”, acrescentou.
A juíza destacou que a subordinação jurídica, de grande importância na doutrina brasileira como traço característico do contrato de emprego, não se apresenta de forma homogênea para homens e mulheres. “A assimetria nas relações trabalhistas revela-se mais forte quando se trata das mulheres, inclusive no aspecto de violência de gênero”, afirmou. Também destacou que o machismo estrutural estabelece barreiras para impedir mulheres de ocuparem de forma igualitária determinados cargos e profissões.
Ao final de sua fala, a magistrada declarou que é urgente a reflexão sobre um Direito do Trabalho feminista. “O feminismo não atua apenas a favor das mulheres. É uma esperança contra todas as formas de opressão e recoloca em outros termos as dualidades que violentam a diversidade”, afirmou.
A palestra foi mediada pela juíza Carolina Paiva, coordenadora acadêmica da Escola Judicial do TRT-4.