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Publicada em: 16/12/2020 14:41. Atualizada em: 16/12/2020 15:08.

Shopping deve indenizar trabalhadora negra que precisou desfazer penteado afro por ordem da chefia

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Imagem meramente ilustrativa (IStock/Banco de Imagens)

A 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) condenou um shopping a pagar indenização por danos morais, no valor de R$ 10 mil, a uma trabalhadora negra que precisou retirar seus dreads – um tipo de penteado afro – por ordem da supervisora. 

A autora da ação atuou como fiscal de higienização no shopping. Conforme o processo, ela fez o penteado em março de 2017, tendo ganhado de presente do marido. No mês seguinte, ao ser transferida do turno da noite para a jornada diurna, passou a ser observada pelos gerentes e coordenadores. No terceiro dia de trabalho no novo turno, recebeu a ordem para a retirada dos dreads. Conforme informou a sua supervisora, a exigência teria partido do setor de Recursos Humanos. O custo informado por ela para fazer a aplicação foi de R$ 1 mil e, para a retirada, de R$ 250.

Em depoimento, a autora relatou que chorou por diversas vezes no ambiente de trabalho. Disse que não tinha mais vontade de se olhar no espelho, pois havia incorporado o cabelo ao seu estilo. Afirmou terem ocorrido diversos momentos de desânimo e de falta de vontade de ir trabalhar, devido à imposição de retirada do penteado que havia sido fruto das economias da sua família. Disse, ainda, que imaginava que deveria ser reconhecida pelo trabalho prestado, e não pela raça e cabelo afro.

Além da questão do penteado, a trabalhadora relatou que havia tratamento diferenciado em relação às folgas concedidas. A ela eram dados menos dias que aos demais colegas. Ao reclamar, foi repreendida, bem como os colegas que questionaram sobre a distinção.

Em defesa, a empresa afirmou que “jamais tal recomendação seria feita” e que “possui inúmeros colaboradores afrodescendentes, sendo que vários usam cabelo trançado, com dreadlocks ou mesmo no seu formato e volume naturais”.

O juízo da 28ª Vara do Trabalho de Porto Alegre considerou insuficientes as provas para a condenação, pois não teria havido a efetiva comprovação de que a trabalhadora retirou as tranças por exigência da supervisora da empresa. 

As partes recorreram da decisão de primeiro grau, em diferentes itens. Um dos tópicos questionados pela autora foi o indeferimento da indenização por danos morais.

A relatora do acórdão, desembargadora Maria Cristina Schaan Ferreira, considerou provada a atitude discriminatória, com base no depoimento de uma das testemunhas. Segundo a depoente, a prática era reiterada, pois, além da autora da ação, ela mesma e uma outra colega já haviam recebido ordens com o mesmo teor. De acordo com o depoimento, nas palavras da supervisora, elas deveriam retirar as tranças “para dar exemplo”.

Para a desembargadora Maria Cristina, a determinação da empregadora nada tem a ver com o trabalho executado pela empregada. A magistrada adotou em sua decisão os fundamentos expostos pelo procurador regional do Trabalho Leandro Araújo, ao emitir parecer sobre o caso:   “A sociedade brasileira, nesta quadra do século 21, vem produzindo movimentos sociais de afirmação, a partir de segmentos ditos marginalizados ou discriminados, nisto se incluindo as questões de gênero, de raça, de orientação sexual, de crença religiosa, entre outras. A afirmação de identidade racial abrange, entre suas várias modalidades de manifestação exterior, o uso de vestimentas e penteados que evocam as crenças e tradições da ancestralidade africana. O uso de tranças, em tal contexto, mais que mera opção estética, possui um simbolismo de pertencimento que deve ser respeitado, e sua proibição pura e simples, sem que haja alguma razão objetiva para a vedação, constitui-se em prática discriminatória, vedada pelo ordenamento jurídico”, opinou o representante do Ministério Público do Trabalho (MPT/RS).

A trabalhadora havia sido despedida por justa causa pelo shopping. Porém, no recurso, a 6ª Turma anulou a justa causa e determinou a rescisão indireta do contrato, em razão da falta grave cometida anteriormente pelo empregador. “No caso concreto, a prática discriminatória e preconceituosa perpetrada pela reclamada, consoante analisado no item anterior, é grave o suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Entendo que o fato de a reclamante ter sido posteriormente despedida por justa causa não obsta esse entendimento, na medida em que os fatos relativos à prática discriminatória são anteriores à justa causa”, explicou a relatora. Assim, a autora também terá direito ao pagamento de aviso prévio proporcional, multa de 40% sobre o FGTS, liberação dos depósitos do FGTS, bem como ao fornecimento de guias para habilitação do seguro-desemprego.

A trabalhadora também deverá receber R$ 500, por danos materiais. “Em que pese não tenha vindo aos autos prova dos valores referidos pela autora na inicial, é inequívoco que há um custo para a realização das tranças afro e para sua retirada, razão pela qual arbitro o valor devido a esse título em R$ 500,00, em observância ao princípio da razoabilidade”, destacou a desembargadora Maria Cristina.

A decisão da 6ª Turma foi unânime. Também participaram do julgamento as desembargadoras Simone Maria Nunes e Beatriz Renck. O shopping já recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

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Fonte: Secom/TRT4. Foto: Delmaine Donson/IStock (Banco de Imagens)
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