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Publicada em: 25/06/2019 10:59. Atualizada em: 25/05/2020 15:53.

Combate ao trabalho infantil é debatido em audiência coletiva no TRT-RS

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Imagem aberta do palco do auditório, aparecendo os debatedores sentados e, à esquerda, a presidente Vania Mattos fazendo seu pronunciamento, no púlpito.
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O combate ao trabalho infantil foi tema de uma audiência coletiva na Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS), nesta segunda-feira (24/6). O evento “Trabalho Infantil: um desafio para ser enfrentado em rede” foi promovido pelo TRT-RS por meio do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, em parceria com o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS). 

A atividade integrou o conjunto de ações realizadas pela Justiça do Trabalho em alusão ao Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, celebrado anualmente em 12 de junho. A data foi instituída pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 2002, com o objetivo de alertar a comunidade em geral e governos sobre o problema.

Na abertura do evento, a presidente do TRT-RS, desembargadora Vania Cunha Mattos, lamentou que o país continue com um número elevado de crianças em situação de trabalho infantil. A magistrada criticou o fato de algumas formas de trabalho infantil serem toleradas e estimuladas pela sociedade, como o trabalho artístico de crianças na televisão, e ressaltou que o trabalho na infância impede a criança de ter acesso a uma formação integral. “Este trabalho é tão nocivo para a criança quanto qualquer outro”, declarou. A magistrada apresentou ao público estatísticas que revelam que mais de 2,7 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estão em situação de trabalho no Brasil. 

Vania Mattos observou que a Justiça do Trabalho gaúcha, atenta a este problema, desenvolve desde 2017 um convênio com o Projeto Pescar, em parceria com o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS), a Seção Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS) e a Caixa de Assistência dos Advogados do Estado (CAA/RS). A iniciativa proporciona a qualificação profissional e o desenvolvimento pessoal de jovens de 16 a 19 anos em situação de vulnerabilidade social. “Este projeto mostra o comprometimento da nossa Instituição com o futuro, propiciando a efetiva integração desses jovens na sociedade e a certeza de que eles terão um trabalho decente para suprir suas necessidades. Esse compromisso é fundamental, por não haver dúvidas de que a educação é o fator primordial para o desenvolvimento econômico e cultural do país”, declarou. 

O vice-procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul, Gilson Luiz Laydner de Azevedo, observou que, além de retirar as crianças das situações de trabalho infantil, é importante oferecer opções para que elas não regressem a essa condição. “No caso do trabalho infantil temos duas preocupações principais: a primeira é tirar a criança da rua e colocar na escola. Além disso, também são necessárias políticas públicas para que as famílias não coloquem as crianças em situação de trabalho”, observou. O procurador do Trabalho observou que se a educação não for prioridade, não há como reduzir a desigualdade social e nem como garantir a dignidade da pessoa humana a todos os brasileiros, um dos objetivos fundamentais da Constituição Federal. 

A gestora regional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem, desembargadora Maria Madalena Telesca, observou que os juízes e desembargadores do Trabalho gaúchos sempre se preocuparam com este problema, e mencionou a criação da Secretaria de Combate ao Trabalho Infantil na Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 4ª Região (AmatraIV) em 1998. “Se o Brasil almeja o compromisso de eliminar as piores formas de trabalho infantil até 2020 e todas as formas de trabalho infantil até 2025, deve contar com um conjunto de políticas públicas que integrem um sistema e garantam efetivamente os direitos das crianças”, declarou. A magistrada ressaltou que o trabalho infantil aprofunda a pobreza e a exclusão social. “Quase 80% dos trabalhadores que estão em situação análoga à de escravidão trabalharam na infância. Além disso, quem trabalha desde cedo tem menos chances de seguir no mercado de trabalho formal. É importante frisar que as consequências do trabalho infantil são muito graves”, afirmou. 

A realidade do trabalho infantil no Rio Grande do Sul 

A coordenadora regional da Coordinfância, procuradora do MPT-RS Ana Lúcia Stumpf Gonzalez, comentou que a luta contra o trabalho infantil é uma tarefa árdua, porque exige o combate à desinformação e às fake news. “A desinformação forma a percepção equivocada, por exemplo, de que a maioria dos infratores são menores de idade, e isso não é verdade. Ou de que a maioria dos delitos infracionais cometidos por jovens são delitos graves, e isso também não é verdade. Nós sabemos disso porque temos acesso aos dados, e precisamos difundi-los”, observou. A procuradora do Trabalho destacou que as piores formas de trabalho infantil incluem o tráfico de entorpecentes e a exploração sexual, e destacou que o trabalho em rede é fundamental para um enfrentamento mais eficiente do problema. “É importante que o conselheiro tutelar, por exemplo, tenha contato com os profissionais da área da saúde, que podem verificar durante o atendimento se a criança ou adolescente foi vítima de violação”, comentou. A fala da procuradora foi precedida pela exibição de um trecho do documentário “Ser criança – um olhar para a infância e a juventude diante do trabalho no Brasil”, produzido pela Transe filmes, em parceria com o MPT-RS e com o apoio do Canal Futura. O documentário apresenta a história de vários jovens gaúchos que sofreram as consequências do trabalho na infância e na adolescência. 

A promotora de Justiça da Infância e Juventude de Porto Alegre, Cinara Vianna Dutra Braga, apresentou o funcionamento do sistema de acolhimento institucional no município. A capital gaúcha conta atualmente com 84 casas de acolhimento, que recebem cerca de mil crianças e adolescentes que foram abandonados, são órfãos ou foram vítimas de violência. “Entre esses adolescentes, um grande percentual foi vítima de exploração sexual ou tráfico de entorpecentes, e muitas vezes são explorados no trabalho infantil pelos adultos que deveriam ser seus cuidadores. A grande maioria tem defasagem escolar. Quando completarem 18 terão que sair do espaço de acolhimento, e para onde irão?” questionou. A promotora apresentou projetos que vêm sendo realizados em rede, com a participação da Superintendência Regional do Trabalho, do MPT-RS, e o apoio do TRT-RS, que buscam preparar os jovens do sistema de acolhimento institucional por meio da inserção em vagas de aprendizagem. Também foram firmadas parcerias para o oferecimento de atendimento de saúde mental e de formação no Ensino Fundamental e Médio na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA), além do acesso a cursos técnicos. “São iniciativas que fazem parte do projeto ‘Aprendizando Porto Alegre” e buscam possibilitar que esses jovens possam efetivamente ter acesso à cidadania plena quando completarem 18 anos de idade”, explicou. 

A coordenadora da Comissão Municipal do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Competi), Helena de La Rosa da Rosa, apresentou alguns dados relativos ao problema do trabalho infantil em Porto Alegre. Segundo ela, há, em média, mil crianças nessa situação na cidade. Só nos quatro primeiros meses de 2019, 713 crianças e adolescentes foram flagrados exercendo alguma atividade irregular na Capital – as ocorrências mais comuns foram comércio informal, reciclagem e mendicância. Além desses, outros 167 adolescentes cumprem medidas socioeducativas por estarem atuando junto ao tráfico de drogas. Para resolver esses problemas, a Competi promove diversas ações que vão da identificação ao acompanhamento de jovens em situação de vulnerabilidade social. Entre as medidas apresentadas pela coordenadora da Comissão, estão a construção de um protocolo integrado de gestão do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) de Porto Alegre, a contratação, por meio de licitação, de uma consultoria especializada no desenvolvimento de estratégias de enfrentamento às piores formas de trabalho infantil – tráfico de drogas e exploração sexual – e organização de um projeto-piloto intersetorial entre áreas da saúde e de assistência social.

Cerca de 49% dos jovens que trabalham irregularmente no Rio Grande do Sul são maiores de 14 anos, apontou a coordenadora da Competi. Isso significa que eles poderiam ser inseridos no mercado como aprendizes. Na visão de Helena, tão importante quanto pensar nessas crianças e adolescentes é pensar no contexto familiar em que esses jovens estão inseridos, visto que muitos deles vêm de famílias sem renda formal e em situação de extrema vulnerabilidade. “Quando a gente fala de superação do trabalho infantil, a gente precisa falar de trabalho e renda para essas famílias”, afirmou.

Representando a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RS), Carmela Grüne iniciou sua participação com um dado preocupante relacionado à escolarização no Brasil: de acordo com a pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, 40% da população de 25 anos ou mais não tem Ensino Fundamental completo. “Esse dado é extremamente alarmante num momento político em que se pensa em construir mais presídios e não se investe em educação”, pontuou Carmela. Ela também citou algumas iniciativas idealizadas ou apoiadas pela OAB que tratam do tema dos Direitos Humanos, como o “Direito no Cárcere” e o “Desmistifcando o Direito”, além da presença de voluntários na escola Antão de Faria, no bairro Bom Jesus, periferia de Porto Alegre. Ao chegarem na escola após o assassinato de um aluno no ano passado e se depararem com uma situação de extremo abandono, voluntários realizaram um projeto de arrecadação de kits escolares para os 800 alunos da instituição – no fim, nem todos os kits foram usados porque, felizmente, alguns alunos não necessitavam deles, contou Carmela.

Para a representante da OAB, é importante a efetiva participação cidadã para que haja, de fato, uma mudança. Não é possível, na visão dela, que as pessoas esperem apenas por medidas do poder público. “Não é que não vamos precisar do trabalho do Ministério Público, que é excepcional, mas, se nós temos uma doação, nós temos que aplicá-la. Como é que a gente vai esperar licitação para poder aplicar uma tinta que já está com o prazo de validade vencido?”, questionou, referindo-se a uma doação da distribuidora Progresso que, a pedido de Carmela e outros voluntários, doou toneladas de tintas a escolas públicas da Cidade (a mesma empresa já doava, também a pedidos de voluntários, à Cadeia Pública de Porto Alegre). “O Estado tem que estar preparado e nós, enquanto sociedade, precisamos lutar para que o Estatuto da Criança e do Adolescente seja mantido”, finalizou.

A coordenadora da Aprendizagem da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Rio Grande do Sul, a auditora fiscal do Trabalho Denise González, também se manifestou. Em sua fala, Denise mostrou que existe um déficit de aprendizes no Estado: há uma demanda de 67 mil vagas, em cerca de 28 mil empresas. Entretanto, apenas 39 mil destas vagas estão preenchidas atualmente – um déficit de 28 mil jovens. Somente em Porto Alegre, o número de vagas disponíveis não preenchidas chega a 7,4 mil. “Tem lugar para todos esses problemas, todas essas demandas, todas essas deficiências”, afirmou a auditora. Denise também mostrou como a fiscalização da aprendizagem é feita e apresentou números referentes a quantidade de notificações e empresas notificadas, pois, de acordo com ela, muita gente diz não haver qualquer fiscalização em relação às tarefas exercidas pelos aprendizes. Ela terminou pedindo o apoio da plateia: “Eu conclamo a todos: sejam nossos parceiros”. “Nós temos ferramentas para encaminhar esses jovens para o mundo do trabalho. E qualificados”, concluiu.

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Fonte: Guilherme Villa Verde e Leonardo Fidelix (Secom/TRT4)
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