PJe 10 anos: “O diálogo com todos os interessados sempre foi o caminho para superar obstáculos e encaminhar soluções”, avalia o desembargador Cláudio Cassou
A chegada do sistema PJe à Justiça do Trabalho gaúcha completou 10 anos no último sábado (24/9). Para marcar a data, o TRT-4 está publicando uma série de matérias sobre o tema. Leia abaixo uma entrevista com o coordenador do Comitê Gestor Regional do PJe, desembargador Cláudio Antônio Cassou Barbosa, na qual ele fala sobre a implantação do processo eletrônico no Rio Grande do Sul, ressalta a importância da colaboração de todos os envolvidos e avalia a evolução do sistema desde 2012...

Quais foram os maiores desafios da implantação do PJe na Justiça do Trabalho gaúcha?
Em primeiro lugar, sabemos que o TRT-4 é um dos grandes tribunais trabalhistas, em número de processos, juízes, servidores, representantes do Ministério Público, advogados, procuradorias e peritos. Todos necessitavam ser preparados para a mudança. Além disso, havia uma resistência ao PJe, que na época era um processo eletrônico em desenvolvimento, ainda não maduro. Era necessário fazer muito treinamento interno e externo, e colaborar para o desenvolvimento, tudo ao mesmo tempo. Por isso, entendo que foi correta a decisão de fazer a implantação de forma gradual, de 2012 até 2015, em quatro anos.
Quais foram as principais mudanças e benefícios trazidos?
Sem dúvida a facilidade de acesso aos autos do processo, de forma simultânea, o protocolo eletrônico de petições, a eliminação de trabalho burocrático nas secretarias, a rapidez com que os processos tramitam com os prazos comuns e a eliminação do uso do papel, com o fim da possibilidade de extravio de autos e da necessidade de restauração. A segurança da prática de atos judiciais está consagrada pelo uso da assinatura digital. Os benefícios estão relacionados a estas mudanças. De outro lado, fica evidente a importância do trabalho humano dos juízes, e dos servidores que os auxiliam, na elaboração de minutas de despachos, decisões, sentenças e votos. Isso não mudou, ao contrário, o processo chega mais rápido na mesa do juiz.
Que papel foi desempenhado pelo Comitê Gestor Regional do PJe durante a implantação e nos últimos dez anos?
Foi um papel de coordenação da implantação, de manter o diálogo com todos os atores envolvidos, receber as principais demandas de melhorias para encaminhar ao Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT). O PJe é um sistema nacional na Justiça do Trabalho e foi autorizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que, através do CSJT, fossem desenvolvidas melhorias que contemplassem as necessidades e peculiaridades da Justiça do Trabalho, do processo do trabalho. Para tanto, foi instituída uma rede de governança, a partir do Comitê Gestor Nacional do PJe da Justiça do Trabalho, com comitês regionais em cada TRT.
Durante a implantação no TRT-4 foi criada a Secretaria de Gestão de Mudanças. Ela contou com participação de servidores da Setic, do 1º grau e do 2º grau, uma verdadeira força tarefa, que concentrou os esforços, planejou e executou a implantação do PJe no Rio Grande do Sul. A secretaria funcionou sob minha coordenação e era subordinada à Presidência do Tribunal. Após cumprida essa missão, essa secretaria foi extinta e as atividades foram aos poucos absorvidas por diversas áreas, como a Setic, a Secretaria-Geral Judiciária, a Corregedoria e a Escola Judicial, entre outras. A partir de então, o Comitê Regional do PJe passou a ser de fato o centro de coordenação de esforços, conjugando os públicos externo e interno. Um bom exemplo ocorreu durante a implantação do PJe-Calc (ferramenta satélite para elaboração de cálculos), quando foram recebidas as demandas dos peritos. Na ocasião, a Associação dos Peritos na Justiça do Trabalho 4ª Região (Apejust) foi incorporada ao Comitê e participou da organização dos treinamentos.
Como o senhor avalia a importância do diálogo com os usuários internos e externos do processo eletrônico para a evolução do sistema?
O diálogo é fundamental, foi o caminho trilhado desde sempre para superar os obstáculos, receber as críticas e as demandas, e encaminhar soluções. Neste sentido, desde o início colocamos na composição do Comitê do PJe a participação ampla dos interessados: a advocacia através da OAB, mas também das associações de advogados, depois a Procuradoria Geral do Estado, que tem suas peculiaridades e relevância, o Ministério Público do Trabalho, que vem sendo um excelente parceiro, e posteriormente a Apejust, além de representantes de juízes e de servidores. Registro que a marca do diálogo está presente em nível nacional, desde que o CSJT decidiu adotar o desenvolvimento colaborativo, que foi o grande motivo pelo qual a Justiça do Trabalho brasileira conseguiu manter o seu processo eletrônico único e padronizado nacionalmente. Com essa iniciativa foi possível desenvolver rapidamente uma nova arquitetura para o sistema, módulos e satélites muito importantes e que são utilizados por todos os TRTs, cada tribunal fazendo uma parte desta grande obra de programação, coordenada pelo CSJT.
Em quais aspectos o PJe mais avançou nos últimos 10 anos?
O avanço começou pela nova arquitetura do sistema, que permite um desenvolvimento mais célere, correções de erros e identificação de problemas, bem como os testes de novas versões de uma maneira compatível com os tempos atuais. No sistema antigo, seria impossível avançar da mesma forma. E tudo isso somente foi possível pelo modelo colaborativo pelo qual todas as secretarias de Tecnologia da Informação, dos 24 TRTs, trabalham de forma compartilhada e complementar, sob a coordenação do CSJT, o que se traduz em eficiência na eliminação de trabalhos dobrados. O sistema atualmente funciona sem dificuldades operacionais, e quando ocorrem é devido a alguma intercorrência com a rede de internet, ou mesmo a falhas de equipamentos. Com o PJe Mídias, foi possível manter a Justiça do Trabalho funcionando durante a pandemia, com audiências telepresenciais, julgamentos virtuais e por videoconferência, o que já representa uma grande conquista para a sociedade.
Em que pontos o senhor avalia que o PJe ainda pode avançar?
O PJe de certa forma representa o velho processo em papel, porém operando no meio digital, com as facilidades de acesso, do peticionamento à distância, e as demais vantagens que já destacamos. É possível uma automação ainda maior, com o uso de robôs e de dados, com o apoio da inteligência artificial, para apoiar o trabalho dos juízes, qualificar e dar maior agilidade na prolação de sentenças e de julgamentos. Acredito ser fundamental o debate com todos os atores, em especial a advocacia, no sentido de haver um cuidado maior na classificação dos assuntos de cada processo, e evitar petições longas em demasia, com excesso de transcrições de textos e de jurisprudência, sem necessidade. Acredito que um processo justo depende de uma cooperação entre juízes e advogados, para que seja produzida a prova necessária ao julgamento, observado o contraditório e ampla dilação probatória, mas sem cair nos riscos do "copia e cola". Fui advogado por mais de 20 anos e sou desembargador há mais de 14 anos, então conheço um pouco do riscado. Juízes e advogados devem cada um exercer sua função, são essenciais para a Justiça, mas com qualidade e compromisso, pois a tecnologia existe para agregar qualidade ao processo, para atender a sua finalidade. Precisamos lembrar que o trabalho mais importante é feito por seres humanos, homens e mulheres, ainda que as máquinas e os robôs possam criar muitas facilidades.
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