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Publicada em: 10/04/2018 16:24. Atualizada em: 11/02/2019 16:20.

Entrevista: Guilherme Dray aborda o impacto da Reforma Trabalhista em Portugal

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Início do corpo da notícia.

09-entrevistaguilhermedray.jpg“A reforma (em Portugal) não teve em vista a promoção da dignidade do trabalhador nem o reforço da sua proteção.”

No dia 20 de abril, a Escola Judicial do TRT4 (Ejud4) realizará a sua Aula Magna para o ano de 2018. O evento terá como ilustres convidados a Doutora María José Fariñas Dulce, professora catedrática da Universidade Carlos III, em Madrid, e o Doutor Guilherme Machado Dray, docente na Universidade de Lisboa.

Dray é professor na Faculdade de Direito na Universidade de Lisboa, e atuou como Chefe de Gabinete do Primeiro Ministro do XVIII Governo Constitucional de Portugal, entre os anos de 2009 e 2011. Na Universidade de Lisboa, é fundador do Centro de Investigação de Direito Privado e dos Institutos de Direito do Consumo e de Direito do Trabalho, sendo membro da direção deste último. Colabora na docência de cursos de Pós-Graduação nas Faculdades de Direito da Universidade Nova de Lisboa e da Universidade Católica do Porto. Também lecionou na Faculdade de Direito da Guiné-Bissau.

Dray é também membro da Comunidade de Juristas de Língua Portuguesa e da Associação Portuguesa de Direito do Trabalho, sendo autor de diversas obras jurídicas especializadas, como “O Princípio da Proteção do Trabalhador”, “Direitos de Personalidade”, “O Princípio da Igualdade no Direito do Trabalho” e “Código do Trabalho Anotado”, em coautoria, todos pela editora Almedina.

Na Aula Magna da Ejud4, Guilherme Dray abordará aspectos da Reforma Trabalhista em Portugal, ocorrida em 2012. Em entrevista concedida à Escola Judicial, compartilhou um pouco da visão que trará na palestra do dia 20/04. 

1) É possível falar em crise da centralidade do trabalho na organização social de países europeus? Como se situa Portugal, especificamente, nesse contexto continental? 

Creio que os países da União Europeia têm atualmente uma abordagem equilibrada e amadurecida das relações laborais. É verdade que após a crise financeira e das dívidas soberanas, de 2008, diversos países europeus (em especial os do Sul) foram compelidos a promover reformas destinadas a flexibilizar o contrato de trabalho e a reduzir o custo do trabalho. Foi o que sucedeu, nomeadamente, em Portugal, Espanha, Itália e França. Passados os anos mais críticos, a situação acalmou e hoje a organização social destes países parece passar por momentos de maior equilíbrio e amadurecimento. O moderno Direito do Trabalho e aquele que se pratica na Europa assenta num equilíbrio – por um lado, continua a promover o princípio da proteção do trabalhador; por outro, garante instrumentos de gestão empresarial que permitem ao empresário gerir convenientemente a sua empresa, de forma competitiva. A dignidade do trabalhador e a proibição de despedidas sem justa causa continuam a ser os grandes pilares do Modelo Social Europeu. E o caso português não foge à regra. Temos uma Constituição que garante direitos laborais e um Código do Trabalho que promove a proteção da parte mais fraca, garantindo em simultâneo a liberdade de gestão empresarial.

2) Em sua opinião, a reforma trabalhista de 2012, em Portugal, impactou a dignidade do trabalhador? 

A reforma laboral portuguesa de 2012 foi em grande medida imposta por instâncias internacionais, nomeadamente pelo Fundo Monetário Internacional, como contrapartida da concessão de crédito ao País. A reforma não teve em vista a promoção da dignidade do trabalhador nem o reforço da sua proteção. Pretendeu-se apenas, num momento de crise, forçar uma reforma centrada na redução do custo do trabalho, na facilitação dos despedimentos, na redução de dias de feriados e na subalternização da negociação coletiva. A reforma não foi pensada ou sequer preparada por juristas. Na sua base, estava uma linha de pensamento econômico que entendia que a competitividade econômica se deve fazer tendo por base a redução do custo do trabalho. Felizmente, em Portugal, o Direito do Trabalho está alicerçado num conjunto muito significativo de direitos constitucionais dos trabalhadores. Tal circunstância, aliada a uma atuação séria e responsável do Tribunal Constitucional português, permitiram que os princípios gerais do Direito do Trabalho e a dignidade do trabalhador se mantivessem intocados. O Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais diversas normas da reforma de 2012 e o princípio da proteção do trabalhador continua, atualmente, a ser o norte magnético do Direito do Trabalho. A proibição de despedidas sem justa causa, o regime dos Direitos de Personalidade, a proibição de atos discriminatórios, a proteção da mulher grávida e do trabalhador menor, bem como a promoção da negociação coletiva e do direito à greve continuam a fazer parte do código genético do Direito do Trabalho português. 

3) É possível depreender o incremento da atividade econômica em Portugal, após a reforma de 2012?

A reforma de 2012 pouco ou nada resolveu do ponto de vista econômico. Pelo contrário, os anos que se seguiram à reforma de 2012 foram os piores em termos de desemprego e reforçaram a quebra da população ativa no mercado de trabalho. O ano de 2013 foi o pior ano do século, em termos de taxa de desemprego e de emigração. Nesse ano, o desemprego atingiu em Portugal a taxa histórica de 16,2%. Por outro lado, 2013 foi também o ano do século em que mais portugueses emigraram para o estrangeiro, em busca de melhores condições de vida. Por isso, não se pode dizer que a reforma de 2012 esteve na origem do incremento da atividade econômica em Portugal, que em bom rigor só começou a recuperar em 2016 e 2017. Hoje, felizmente, o País está de novo no trilho da recuperação, graças ao aumento das exportações e à promoção de novas atividades econômicas, como o turismo. E graças, também a novas políticas ativas de emprego e a uma política social centrada de novo do aumento dos salários e na recuperação dos direitos dos cidadãos. Atualmente, o País está a crescer economicamente, cerca de 2,7% ao ano, e a taxa de desemprego reduziu-se drasticamente, estando atualmente em 8,5%. Por isso, respondendo diretamente à pergunta, o que os anos da crise nos ensinaram é que as políticas de austeridade e de quebra do rendimento não trouxeram algo de positivo, em termos econômicos e de emprego. Pelo contrário, com a retomada de políticas sociais e com a devolução de rendimento à população o emprego voltou a recuperar, o déficit orçamental desceu e voltamos a ter taxas de crescimento econômico como há muito não conhecíamos. O caso português ensina-nos que as reformas laborais exclusivamente centradas na diminuição dos salários e na desproteção do trabalhador não são necessariamente positivas, mesmo em termos econômicos.

Confira, em breve, a entrevista com a Doutora María José Faríñas Dulce, que falará sobre “Globalização Econômica e Direitos Humanos” na Aula Magna da Escola Judicial do TRT4 (Ejud4), em 20 de abril.

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Fonte: Pedro Gomes Pereira da Silva (Escola Judicial do TRT4)
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