Artigo: 'Acidentes de trabalho: prevenção para superar o conformismo', por Raul Zoratto Sanvicente, desembargador do Trabalho da 4ª Região
Por Raul Zoratto Sanvicente, desembargador do Trabalho da 4ª Região
A data de hoje, 28 de abril, foi designada em 2003 pela OIT – Organização Internacional do Trabalho, como o Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho, também mencionado em outros ambientes como Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes de Trabalho e Doenças Ocupacionais. Teve origem na tragédia da mina de carvão de Farmington, Estado de Virgínia, nos Estados Unidos, ocorrida em 1968 e na qual pereceram 78 trabalhadores. Graças ao movimento sindical, foi adotado em alguns países e depois pela OIT. No Brasil, è lei desde 2005.
Segundo dados da OIT, a cada dia no mundo morrem nada menos do que 5 mil trabalhadores em razão de acidentes de trabalho. Por ano, são 270 milhões de acidentes, além de 160 milhões de casos de doenças ocupacionais. O Brasil detém a sua parcela, e já esteve no nada invejável posto de campeão de acidentes, há algumas décadas.
O que surpreende, diante desse quadro, é a sua persistência, quando se sabe que todo acidente tem uma causa, e uma causa previsível. Há uma “zona de conforto”, se é que se pode usar essa expressão, baseada na indiferença e no conformismo de que é assim mesmo,” e não há o que fazer.” O fatalismo e a constatação, baseada em crenças culturais tão arraigadas quanto errôneas, de que afinal, foi culpa da vítima que não soube realizar o trabalho, se descuidou, estava distraída, etc. Acabou morrendo, mas o trabalho tem que continuar e assim é computada mais uma “morte bianca”, como dito na Itália, para indicar o esquecimento que pronto recairá sobre aquela perda. A cada ano, no dia 28 de abril, no entanto, somos lembrados de que sim, há muito o que fazer, e não somente um dia por ano, mas todos os dias: é a prevenção.
Recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho – TST, instituiu o Programa Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho, ou Programa Trabalho Seguro. Seu escopo é desenvolver uma cultura de prevenção, somando-se a inúmeras instituições públicas e privadas que há décadas têm o mesmo objetivo.
Falar de cultura é falar de tempo. Em uma ilustração de como são arraigados os antigos costumes culturais, basta refletirmos sobre dois vocábulos muito utilizados nesta matéria: infortúnio e sinistro. Todos sabem que designam acidentes. O infortúnio seria a ausência de fortuna, ou seja, de sorte. Aquele que o sofre foi designado pela mitológica deusa Fortuna, que, cega, distribuía o destino dos homens aleaoriamente. Aquele acidentado não teve sorte”, quando se sabe que acidentes têm causas.
Já as explicações para o uso da palavra sinistro, como designação de acidente, são muitas, mas todas conduzem à constatação de antiquíssimas raízes culturais preconceituosas e equivocadas: sinistro é esquerdo e este designa o mal. Na Idade Média acreditava-se que os acidentes com os mineiros eram causados por criaturas demoníacas que viviam nas profundezas da Terra. Ou, as coisas bem feitas o são com a mão direita. As feitas com a mão esquerda são mal feitas e causam acidentes.
Com base nesses e em outros preconceitos, apaga-se a ideia de que acidentes são preveníveis. Prever é ver antes. A maioria dos processos produtivos é conhecida há muito tempo. Não se entende por que em certas atividades não se adota a precaução (outro conceito chave).
Chegamos a mais um 28 de abril, quantos virão para que possamos “comemorar”esta data?
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