O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS), em parceria com o Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), realiza nesta quarta-feira (29/10) mais uma edição do “Projeto Itinerante RS – Trabalho Decente”.

O evento foi realizado no município de Vacaria, nos Campos de Cima da Serra, reconhecido nacionalmente pela fruticultura, especialmente pela produção de maçãs.

O seminário tem como principal objetivo esclarecer a comunidade local — incluindo poder público, produtores rurais, empresários, advogados, contadores, trabalhadores e estudantes — sobre a legislação e o tratamento das questões urgentes que envolvem o emprego de migrantes na colheita de frutas e em outras atividades agrícolas, muitas vezes sem registro ou documentação adequada.

Assim como na edição anterior, realizada na cidade de Arvorezinha, foram realizadas tratativas prévias com a comunidade para a formatação da atividade, garantindo que os temas debatidos correspondessem às principais dúvidas locais, como atribuições de cada instituição (MTE, MPT, TRT), requisitos mínimos para contratação de trabalhadores migrantes, procedimentos para regularização e condições de trabalho decente.

O evento busca mobilizar e integrar a comunidade de Vacaria em torno do enfrentamento ao trabalho escravo contemporâneo, promovendo o diálogo entre poder público, produtores, agricultores, empresários e trabalhadores, na busca de soluções conjuntas para a realidade vivida pela região.

A programação conta com palestras sobre temas voltados para a atuação da fiscalização do trabalho, a promoção dos direitos trabalhistas pelo MPT, além de um painel dedicado ao Programa de Enfrentamento ao Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Proteção ao Trabalho do Migrante, iniciativa coordenada pelo TRT-RS.

A mesa de abertura foi composta pelo desembargador Manuel Cid Jardon e pelo juiz Charles Lopes Kuhn, gestores regionais do Programa Nacional de Enfrentamento ao Trabalho Escravo e ao Tráfico de Pessoas e de Proteção ao Trabalho do Migrante no TRT-RS; Eduardo Gargioni, procurador-geral do município de Vacaria; Edimar Biazzi, presidente da Câmara de Vereadores de Vacaria; Gerson Soares Pinto, superintendente-adjunto do Ministério do Trabalho e Emprego no RS; e Sérgio Poletto, presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Assalariados Rurais de Vacaria e Muitos Capões e vice-presidente da FETAR-RS.

Autoridades destacam importância do diálogo e da proteção social

Ao abrir oficialmente o evento, o desembargador Manuel Cid Jardon ressaltou a importância da iniciativa como um espaço de aprendizado mútuo e construção coletiva. 

“O Judiciário não está aqui para condenar, mas para dialogar, orientar e promover ações educativas”, afirmou. Ele destacou que o Programa de Enfrentamento ao Trabalho Escravo e de Proteção ao Trabalho do Migrante busca articular instituições e comunidades para prevenir violações e promover o trabalho decente.

Jardon enfatizou que a luta contra o trabalho escravo é também uma defesa da dignidade humana. 

“A escravidão desumaniza, despersonaliza e aniquila a dignidade de quem é submetido a ela. Combater essa prática é defender a vida em sociedade e a própria noção de cidadania”, disse. O magistrado lembrou ainda que a erradicação do trabalho escravo é uma responsabilidade compartilhada entre poder público e sociedade civil: “O compromisso é de todas e todos. O trabalho decente é um direito humano.”

O juiz Charles Lopes Kuhn, também gestor regional do programa, reforçou a importância do conhecimento e da articulação institucional para o enfrentamento das novas formas de exploração. “O Brasil demorou muito a reconhecer a existência do trabalho escravo contemporâneo, mas hoje temos o dever de enfrentá-lo com firmeza e transparência”, afirmou. 

Ele destacou o papel de Vacaria e da região dos Campos de Cima da Serra na recepção de trabalhadores migrantes, o que exige atenção redobrada.

“Estamos aqui para aprender com a comunidade e com as instituições locais. O conhecimento é o instrumento mais eficaz para prevenir abusos e garantir relações de trabalho mais justas”, disse. 

O magistrado também observou que o evento é parte de uma caminhada permanente: “O que discutirmos aqui não termina hoje. Vamos levar o que aprendermos para outras regiões e multiplicar essas experiências.”

O superintendente-adjunto do Ministério do Trabalho e Emprego, Gerson Soares Pinto, destacou a necessidade de cooperação entre as instituições para prevenir irregularidades antes que elas se tornem casos de autuação. “Quando as portas estão abertas ao diálogo, todos ganham. A função do MTE é orientar, mediar e ajudar a resolver antes que o problema vire infração”, explicou.

Gerson observou que o trabalho escravo “contamina” a imagem de uma região e afeta a economia local. “Nenhum produtor quer ver o nome do seu município associado à exploração. A erradicação do trabalho escravo é uma pauta de desenvolvimento, de competitividade e de ética empresarial”, completou.

Representando os trabalhadores rurais, Sérgio Poletto, presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Assalariados Rurais de Vacaria e Muitos Capões, fez um apelo à união entre produtores, sindicatos e órgãos públicos. “Este é um momento ímpar para refletirmos sobre o trabalho decente na região. Todos temos o mesmo objetivo: garantir condições dignas para quem produz e segurança jurídica para quem emprega”, afirmou.

Poletto também relembrou episódios de fiscalização recente que resultaram em resgates de trabalhadores em condições degradantes. “Infelizmente, ainda há casos em que o trabalhador chega para colher e acaba saindo endividado ou explorado. Isso precisa acabar — e começa com orientação e diálogo, não apenas com punição”, defendeu.

O procurador-geral do município, Eduardo Gargioni, representou o prefeito de Vacaria e destacou o impacto social e econômico da migração na região. “Muitos trabalhadores que vêm para a colheita acabam permanecendo na cidade, o que exige do poder público políticas de acolhimento e serviços de saúde, moradia e educação”, observou.

Gargioni afirmou que o município busca equilibrar os direitos dos trabalhadores com as necessidades dos empregadores. “É preciso pensar os dois lados da relação de trabalho, com responsabilidade e diálogo”, completou.

O presidente da Câmara de Vereadores, Edimar Biazzi, ressaltou o papel do Poder Legislativo local na promoção de políticas públicas voltadas ao trabalho digno. “Vacaria é uma terra de gente trabalhadora, e o trabalho é o maior instrumento de emancipação social. Cabe a nós, como representantes públicos, garantir que ele seja também um espaço de respeito e valorização humana”, afirmou.

Painéis

A programação do evento segue com três painéis temáticos:

“Atuação da Fiscalização do Trabalho na Garantia do Trabalho Digno no RS”, com os auditores fiscais do Trabalho Lucilene Pacini e Rafael Zan;

“Atuação do MPT na Promoção dos Direitos dos Trabalhadores do RS”, apresentado pela procuradora do Trabalho Franciele D’Ambros, coordenadora da Conaete (Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas) no Rio Grande do Sul;

“Programa de Enfrentamento ao Trabalho Escravo, ao Tráfico de Pessoas e de Proteção ao Trabalho do Migrante”, conduzido pelo desembargador Manuel Cid Jardon e pelo juiz Charles Lopes Kuhn.

Também fizeram parte da comitiva do TRT-RS em Vacaria os servidores Elen Cristina Presotto, Cícero da Silva Ferreira, Lauren Fernanda Redin e Eliane Cristina Pereira da Silva, da Coordenadoria de Sustentabilidade, Acessibilidade e Inclusão; Rafael Filla Nunes, do Cerimonial; Paulo Ricardo Pereira, do Transporte; Rodrigo Navarro Roxo, Maurício Oliveira do Amaral e Luis Evandro Brasil, da Polícia Judicial; e Liliam Oliveira Pereira, da Secretaria de Saúde.