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Publicada em: 11/09/2012 00:00. Atualizada em: 11/09/2012 00:00.

Artigo: 'Características do Trabalho Escravo Contemporâneo - 2ª Parte', por Marcelo José Ferlin D'Ambroso, procurador do Trabalho da 12ª Região

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Marcelo José Ferlin D’Ambroso, procurador do Trabalho da 12ª Região

Em seguimento ao artigo publicado no último domingo, em que tratamos sobre o que é trabalho escravo, na atualidade, outros fatores também podem identificar essa conduta:

- controle físico (impossibilidade material de condições de saída do local, por ausência de transporte, local inóspito, proibição, vigilância, etc.) e psicológico (engodo, artifício, argumento moral, concernente à servidão por dívida ou simples promessa de paga que nunca acontece ou de forma irrisória);
- ausência de remuneração (ou mínima);
- violência física;
- exploração econômica pelo empregador ou por terceiros (truck-system ou “barracão” – venda de gêneros alimentícios e de primeira necessidade, ferramentas, etc., ao trabalhador);
- aliciamento: recrutamento “voluntário” de pessoas em condições de vulnerabilidade ou ludibriadas mediante deslocamento geográfico (potencializa a fragilização da vítima);
- falta de água potável: água é fonte de vida, negá-la a alguém é negar a sua sobrevivência.

A OIT, de acordo com a Convenção 29 de 1930 (Decreto n. 41721/57), considera que “a expressão ‘trabalho forçado ou obrigatório’ compreenderá todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente”.

De modo que é necessário estabelecer, de imediato, a irrelevância do consentimento da vítima em aceder ao trabalho para caracterização da escravidão contemporânea: ora, é possível falar em consentimento quando há opção, concordar ou não, poder discutir o que está sendo proposto, o que não acontece com a pessoa cuja sobrevivência está em jogo – entre passar fome e tentar a sorte com promessa de trabalho e comida, melhor a segunda alternativa, não importa a que preço.

Evidente que o infrator (explorador) pode alegar que não é responsável por esta situação da vítima, mas não há dúvida de que responde pelas condições em que alocar a pessoa aliciada, a demonstrar, claramente, a prévia intenção de dano (animus nocendi, abutendi e lucrandi), de usar, abusar e lucrar do contratado, tratando-o como coisa (bem descartável), e aproveitando-se de sua vulnerabilidade.

Vê-se, pois, a evolução da vis absoluta na escravidão clássica para a vis compulsiva na submissão atual, mas identicamente apta a reduzir a vítima à condição de objeto. A coação moral que vicia o consentimento do trabalhador na prática é a que nasce de sua condição vulnerável (falta de opção para sobrevivência) ou é imposta pelo conjunto das circunstâncias em que explorado o trabalho. A vulnerabilidade da pessoa favorece o “consentimento” ao aliciamento e à exploração, como também as condições geográficas da região e a distância da presença do Estado na vida do indivíduo – quanto mais inóspita a localidade, quanto menos atendida pelo Estado, maior o potencial de exploração de trabalho escravo.

Assim, contextualizamos a escravidão contemporânea como o conjunto de práticas tendentes a limitar a vontade da vítima, por qualquer meio apto a esta finalidade, aproveitando ou não de sua vulnerabilidade ou fragilização social, e impondo condições degradantes de trabalho que aviltam a dignidade humana.

Nesta definição, o consentimento da pessoa para a exploração é irrelevante por não deter ela nenhum poder de decisão ou mudança sobre as condições de trabalho.

OBS: As opiniões expressas nos artigos publicados neste espaço pertencem exclusivamente aos autores dos textos, não representando o posicionamento do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região em relação ao conteúdo abordado.

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