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Publicada em: 21/08/2023 17:37. Atualizada em: 21/08/2023 18:33.

“Quando abordamos a masculinidade tóxica não estamos falando sobre você, mas sobre como você foi ensinado a ser homem”, declara a professora Rita Von Hunty

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WhatsApp Image 2023-08-21 at 12.02.10 (1).jpegA “masculinidade tóxica” foi o tema da palestra da professora Rita Von Hunty no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), na última sexta-feira (18/8). Ao longo de três horas, a palestrante falou para um público que lotou o Plenário do Tribunal, em um debate sobre o conceito que impacta negativamente homens e mulheres na sociedade atual. “Quando elencamos os termos ‘masculinidade’ e ‘tóxica’, não estamos falando sobre você, estamos falando sobre como você foi ensinado a ser homem”, observou Rita ao comentar o título do evento. 

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A abertura da palestra foi dedicada a demonstrar, a partir de fontes teóricas e exemplos práticos, que é um erro acreditar em um modelo único de masculinidade, destacando que ele foi criado para atender a interesses determinados. “Qualquer ideia que for apresentada a você como ´sempre foi assim´, ´é do interesse de todos´ ou ´não tem como mudar´, na verdade é o interesse da classe que está no poder naquele momento”, observou.

WhatsApp Image 2023-08-21 at 12.03.25 (1).jpegA origem do modelo hegemônico de masculinidade, conforme a palestrante, remonta ao mundo antigo, quando o modelo social era baseado na lógica de que aqueles que tivessem o maior exército ficavam com a maior fazenda. “A partir daqui, a história de política externa, de impérios, vai ser a guerra. Foi cultivado um modelo de masculinidade do homem que está disposto a matar e morrer por algo”, afirmou.

De acordo com a professora, o processo de colonização marcou a exportação desse modelo para o novo mundo. Além da grafia, da catequese e da escravidão, a ideia de masculinidade também teria chegado nas colônias. Rita explicou que, quando o homem europeu desembarcou nas Américas e precisou falar com representantes dos grupos locais, ele sempre iria se dirigir a homens, mesmo quando a liderança de um povo fosse feminina. “Isso muda a dinâmica de poder nos povos colonizados, que agora vão desconsiderar a mulher, porque quem faz a trama de aliança da colonização é o homem. A colonização opera inclusive na destituição de poder das mulheres”, observou. 

WhatsApp Image 2023-08-21 at 12.17.36 (1).jpegAinda nesse ponto, Rita destacou que a categoria de poder masculino não está acessível a todos os corpos. “Como se faz para ser homem sendo soldado, quando alguém está acima de você? Como se faz para ser homem sendo cristão, se é necessário dar a outra face ao tapa? Como se faz para ser homem sendo pobre, se o homem é provedor?”, questionou. 

Um terceiro tópico abordado foi o impacto negativo da masculinidade tóxica para os próprios homens. Ela observou que a população masculina no planeta apresenta números quatro vezes maiores de suicídio, quando comparados com a população feminina, além de figurarem em uma estatística dez vezes maior de morte por crimes violentos. “Existem perguntas subjetivas que você pode tentar responder: qual foi o modelo de carinho no qual você foi socializado? Recebia abraço, bejio, ouvia ´eu te amo´ de quem? Estabelecia diálogo, com quem? Qual relação era fria e distante, de obedecer ordens, e qual tinha proximidade?”, questionou. A palestrante explicou que o conceito de “masculinidade tóxica”, cunhado nos anos 90, refere-se a esse modelo de reprodução de masculinidade que não permite diálogo, afeto ou demonstração de fraqueza. 

Os números da violência

WhatsApp Image 2023-08-21 at 12.13.30 (1).jpegAo final de sua exposição, antes de abrir espaço para as perguntas do público, Rita apresentou estatísticas do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022. Conforme o documento, os feminicídios, que ocorrem em razão do gênero feminino da vítima, cresceram 6,1% em 2022, resultando em 1.437 mortes. “Essas mulheres são mortas, na maioria das vezes, em espaços domésticos por seus companheiros ou ex-companheiros. Morrem por saírem com outras pessoas, por não estarem em casa ou por não terem feito o jantar”, comentou. 

WhatsApp Image 2023-08-21 at 12.14.45 (1).jpeg“Todas as violências contra as mulheres cresceram no ano passado: a patrimonial, a psicológica, a sexual e o atentado contra a vida”, destacou a palestrante. As agressões aumentaram 2,9% (243,7 mil casos), as ameaças aumentaram 7,2% (613,5 mil) e o acionamento do 190 por mulheres, em casos motivados pelo gênero, chegaram a 889,4 mil ligações, o que representa 102 ligações por hora. Os números de assédio sexual aumentaram 49,7% (6.114) e os casos de importunação sexual cresceram 37% (27,5 mil). 

Em 2022, também houve o maior registro histórico de estupros de vulneráveis: foram 74.930 casos. Considerando a autoria, assim como nos anos anteriores, na grande maioria dos casos os abusadores são conhecidos das vítimas (82%) e a maioria das vítimas (88,7%) são do sexo feminino. 

A violência sexual neste país é praticada dentro de casa, à luz do dia, por familiares e conhecidos contra crianças e adolescentes. Pensar que não construímos um modelo de masculinidade doente é não saber em que país estamos e o que está acontecendo. 

Rita concluiu sua fala inicial destacando que é fundamental refletirmos sobre como estamos produzindo ideias de masculinidade e feminilidade para ser possível mudar o paradigma de violência no Brasil. “Não é um debate identitário, é um tema de segurança pública”, acrescentou. “Isso diz respeito a como criamos nossos filhos, como os educamos nas escolas, o que vai compor o currículo escolar. Isso é sobre quais casos chegam para serem julgados aqui, quais tipos de violência chegam nos espaços de trabalho”, refletiu.

Abertura

WhatsApp Image 2023-08-21 at 12.24.23 (1).jpegNa abertura do evento, o vice-presidente do TRT-4, desembargador Ricardo Martins Costa, destacou a importância de uma palestra sobre masculinidade tóxica, “modelo profundamente arraigado em nossa cultura e no nosso imaginário coletivo”. O magistrado acrescentou que, no ambiente de trabalho, a masculinidade tóxica pode aparecer na forma de agressividade, assédio sexual, e na forma da participação feminina nos espaços. “Maior conscientização sobre esse problema e possíveis ações para combater tal forma de agressividade impactarão não apenas na saúde masculina, mas também no ambiente de trabalho em que atuam, e até mesmo nas demais instâncias sociais, o que auxiliará na melhoria da sociedade como um todo”, declarou. 

WhatsApp Image 2023-08-21 at 12.25.14 (1).jpegRepresentando a Escola Judicial do TRT-4, o juiz Rafael da Silva Marques também elogiou a iniciativa, ressaltando a necessidade de debates que promovam um discurso amplamente emancipatório e que exponham os problemas reais da sociedade. O magistrado acrescentou que, mesmo as mulheres sendo as principais vítimas da violência gerada pela masculinidade tóxica, os homens também sofrem suas consequências. “A superação dos modelos sexistas e excludentes passa não pela substituição do homem pela mulher, ou do branco pelo negro, mas pelo aumento da mesa do debate. Estamos aumentando a mesa do debate com amor, compaixão, inclusão e carinho”, concluiu. 

WhatsApp Image 2023-08-21 at 12.26.52 (1).jpegO início do evento também foi marcado por uma apresentação musical dos alunos do Projeto Pescar, acompanhados pelo educador social Andre Cintra, pela servidora Angie Catiuscia Costa Miron e pelo servidor Mário Garrastazu Médici Neto. A Comunidade Jurídico-Trabalhista do Projeto Pescar oferece formação socioprofissional gratuita a jovens em situação de vulnerabilidade social, por meio de uma parceria entre organizações públicas e privadas. 

A palestra de Rita Von Hunty contou com mediação da servidora Angie Catiuscia Costa Miron. O mestre de cerimônias do evento foi o servidor Juliano Machado dos Santos. 

A palestrante

Rita von Hunty é a persona drag do ator e professor Guilherme Terreri. Com formação em Artes Cênicas (UNIRIO) e Língua e Literatura Inglesa (USP), Rita conduz, por meio dos Estudos Culturais, discussões de temas sociais com horizonte emancipatório radical. Ela tem atuado no cinema, no teatro, na TV e no YouTube, além de seus trabalhos como colunista na Carta Capital e vídeo colunista em uma série de outros meios. Como professora convidada ou palestrante, Rita já esteve presente em muitos espaços importantes para as lutas sociais, de sindicatos e escolas públicas a universidades, tanto no Brasil quanto no exterior. Destacam-se suas passagens pela USP, Unicamp, UEPB e o Museu da Resistência, em Lisboa, e a École Polytechnique, em Paris.

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Fonte: texto de Guilherme Villa Verde e fotos de Reinaldo Foltz (Secom/TRT-4)
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