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Publicada em: 30/04/2018 10:53. Atualizada em: 30/04/2018 10:56.

ABRIL VERDE - “Mais de 90% dos trabalhadores acometidos por LER tendem a desenvolver depressão”, afirma psicólogo

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30-antoniocardoso2.jpgUm dos organizadores da 13ª Semana de Prevenção das Lesões por Esforço Repetitivo (LER), ocorrida este mês na Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), em Porto Alegre, o psicólogo Antonio Jane Cardoso foi pioneiro no estudo dessas patologias no âmbito da categoria de profissionais de processamento de dados do país. Iniciou suas pesquisas em 1979, quando integrava a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) do Centro de Processamento de Dados de um banco público. Observou de perto o sofrimento de colegas digitadores que se queixavam de dores nos membros superiores e eram afastados do trabalho. Nos laudos, as doenças que os acometiam eram classificadas como comuns. “O serviço médico do banco minimizava o problema. Quando consultado, não atribuía a doença ao trabalho”, destaca.

Ao perceber a possibilidade de estar diante de uma patologia nova, Cardoso pesquisou em diversas fontes e descobriu que poderia ser uma tenossinovite, doença comum em ambientes de trabalho onde há excesso de movimentos repetitivos associados ao ambiente frio e ao estresse. Em 1982, relatou a doença dentro da CIPA e levou o problema para ser discutido nas principais capitais. No ano seguinte, solicitou a criação de uma sub-comissão na CIPA para tratar do tema. O relatório final da comissão, segundo ele, gerou dados estatísticos que podem oferecer parâmetros até hoje.

A partir de então, Cardoso promoveu, como assessor de saúde das APPDs (Associação dos Profissionais de Processamento de Dados, hoje SINDPPD-RS), discussões nacionais sobre o assunto. Um outro passo importante na sua trajetória, informa, foi a criação da sigla “LER”, em parceria com o médico Antonio Claudio Mendes Ribeiro, diante do fato de que as tenossinovites eram apenas uma das patologias que tinham como causa comum o trabalho em condições adversas. “Hoje, o Ministério da Saúde cita mais de 30 patologias nessas condições”, lembra.

Tentando encontrar soluções para os trabalhadores, planejou e coordenou o I Encontro Nacional de Saúde em Processamento de Dados, realizado em Brasília, em 1986, pelas APPDs do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Desse encontro resultou o reconhecimento da tenossinovite pelo Ministério da Previdência Social e a atualização da NR17, norma regulamentadora do Ministério do Trabalho que estabelece parâmetros para conforto e segurança do trabalhador. Cardoso também especializou-se em Saúde do Trabalhador pela Faculdade de Serviço Social da PUCRS e foi docente dos cursos de especialização em Medicina do Trabalho dos convênios ABRASS (Associação Brasileira de Aperfeiçoamento do Serviço de Saúde) na FFFCMPA (Fundação Federal Faculdade de Ciências Médicas de Porto Alegre), na Universidade do Vale do Taquari (Univates) de Lajeado e na Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Hoje aposentado das funções no banco, atende em consultório e é assessor de Saúde no SINDPPD-RS (Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados no Estado do Rio Grande do Sul).

Conforme Cardoso, mais de 90% dos trabalhadores acometidos por essas lesões tendem a desenvolver Depressão Reativa por LER (DLR). Esse diagnóstico, informa o psicólogo, já foi inclusive aceito em pareceres encaminhados por ele à Previdência Social. “É uma defesa natural do organismo diante de algum tipo de perda, que no caso é ocasionada pelo trabalho. Freud dizia que caminhamos com duas pernas: amor e trabalho. Quando nosso vínculo com o trabalho é cortado, somos impactados por essa perda. Nas situações de doença ocupacional, se o lesionado não se afastar, a lesão pode piorar e cronificar. Portanto, o afastamento por LER muitas vezes se torna indispensável”, explica.

O quadro depressivo é associado a níveis baixos de serotonina (neurotransmissor ligado ao bem-estar), entre outros fatores. Cardoso conta que para permitir que as perdas da vida sejam trabalhadas internamente, o organismo provoca um bloqueio natural e temporário da serotonina, possibilitando, assim, que a pessoa chegue ao “fundo do poço” e solucione em seu âmago a causa real da depressão. Como a DRL é uma depressão reativa e não endógena (da qual não se conhece a causa), ele aponta que o caminho é o trabalhador conseguir compreender e assimilar o impacto da LER na sua vida. “Minha experiência indica que o corpo gera espontaneamente os hormônios necessários quando a solução ou superação dessas perdas ocorre”, explica.

Segundo o psicólogo, as LER tem potencial de causar os seguintes danos à vida do trabalhador, entre outros que também podem levá-lo a desenvolver depressão:

  • Incapacidade física para o trabalho
  • Perda do status profissional
  • Dificuldade de relacionamento com colegas e chefias
  • Sentimento de inutilidade e incapacidade
  • Dificuldade de executar simples tarefas domésticas (lavar e passar roupa, lavar louça, limpar a casa, cozinhar, segurar utensílios, etc.)
  • Dificuldade ou incapacidade de praticar esportes, tocar instrumentos musicais e outros prazeres.
  • Dificuldade de executar atos de cuidado pessoal e higiene (escovar os dentes, lavar o rosto, fazer a barba, pentear o cabelo, abotoar a roupa, amarrar o cadarço, se maquiar, entre outros).
  • Incompreensão da família (segundo o professor Alvaro Merlo, da UFRGS, 80% dos lesionados ficam com a vida conjugal comprometida, e separações são frequentes)
  • Problemas gástricos devido às medicações

Cardoso acrescenta que o sofrimento da vítima é agravado pelo fato de a LER geralmente ser uma doença invisível. Por conta disso, lesionados têm dificuldade em obter o reconhecimento de sua situação e muitos deles chegam a duvidar do seu próprio sofrimento.

Para evitar as LER e a possível depressão decorrente delas, Cardoso bate na mesma tecla que outros especialistas na área: a prevenção é fundamental. Com base na experiência adquirida, entende que o fator determinante para o surgimento da LER é a falta de pausas necessárias para os tecidos se recuperarem do esforço repetitivo. Para ele, o ideal é que o trabalhador faça uma pausa de 10 minutos a cada 50 trabalhados – uma das suas sugestões na NR 17 – e a ginástica laboral também ajuda muito a prevenir a lesão. “Creio que a prevenção da LER em uma empresa pode ser feita principalmente por dois profissionais: o professor de educação física e o administrador. Eles podem ofertar condições de trabalho onde todos saem ganhando. Médicos, psicólogos e fisioterapeutas vão interferir apenas se não houver prevenção, na fase do tratamento”, salienta. No seu ponto de vista, fatores como estresse, força excessiva e más condições de ergonomia também são importantes, mas apenas coadjuvantes ou agravantes no quadro.

O psicólogo recomenda que trabalhadores procurem acompanhamento médico logo nas primeiras dores, pois as LER, se identificadas no início, são curáveis. Depois de cronificadas pela ausência de diagnóstico e/ou de tratamento adequados, são incuráveis ou de difícil recuperação. Também orienta que as pessoas se informem sobre sua lesão e, se não se sentirem satisfeitas com o atendimento médico da empresa, busquem a opinião de outros profissionais ou a assistência do sindicato da categoria.

No contexto geral, Cardoso lamenta que a preocupação com a saúde do trabalhador seja encarada em diversos setores da sociedade e por parte dos sindicatos como mero assistencialismo. “Acredito que a saúde ocupacional é uma das maiores lutas que um sindicato possa se engajar com o trabalhador”, opina.

Com a criação da sigla DORT (Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho), por meio da Ordem de Serviço nº 606 da Previdência Social, Cardoso entende que foi prestado um desserviço ao trabalhador, pois a prevenção foi muito dificultada a partir de então. “Nessa ordem de serviço tentam substituir, de maneira forçada e discutível, o termo lesão por distúrbio. Mas distúrbio significa perturbação, algo temporário. A lesão, na maioria dos casos, é permanente”, explica.

Segundo o psicólogo, é comum o trabalhador encontrar dificuldade de ter sua doença reconhecida como LER pelos patrões. “Dificilmente os empregadores querem emitir a CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho). Nesse caso, ela deve ser emitida pelo sindicato”, diz. Cardoso ainda afirma que frequentemente um empregado é despedido após a empresa diagnosticar uma lesão e não associá-la ao trabalho. Na sua opinião, isso faz com que trabalhadores evitem procurar ajuda quando os sintomas de LER aparecem, por medo de perderem o emprego. E situações como essas, indica o especialista, acabam privando o trabalhador de exercer os seus direitos. “Nesses casos pode-se recorrer à Justiça do Trabalho, único órgão dos três Poderes que mais tem se destacado pela proteção dos trabalhadores”, complementa o psicólogo.

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Fonte: Gabriel Borges Fortes. Fotos: Inácio do Canto (Secom/TRT4)
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