ABRIL VERDE: Lesões relacionadas à atividade industrial são as mais comuns na região de Santa Cruz do Sul
Distante 157 quilômetros de Porto Alegre, o município de Santa Cruz do Sul e cidades vizinhas formam uma região muito forte economicamente, onde se destacam grandes empresas fumageiras, indústrias da alimentação e fabricantes de produtos para o lar e o lazer.
Dando continuidade às matérias relacionadas ao movimento Abril Verde, em prol da segurança e da saúde do trabalhador, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) aborda peculiaridades de acidentes e doenças objetos de ações judiciais no Foro Trabalhista de Santa Cruz do Sul. Quem explica é a juíza-diretora do Foro, Luciana Bohm Stahnke.
De acordo com a magistrada, os problemas de saúde que mais acometem os trabalhadores da região são as lesões por esforços repetitivos (LER) e os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT), além da perda auditiva induzida por ruído (PAIR). “São doenças comuns na atividade industrial”, destaca Luciana. Conforme a juíza, pelo que se observa na jurisdição, os acidentes típicos acontecem em escala muito menor que as LER/DORTs. E outro setor forte na região, a agricultura, não gera número significativo de processos envolvendo acidentes e doenças do trabalho.
Em processo que tramita na 3ª Vara do Trabalho de Santa Cruz do Sul, um ex-empregado de uma indústria fumageira teve perda auditiva que reduziu em 15% sua capacidade laboral. Ele trabalhou em ambiente ruidoso por mais de 15 anos. O laudo pericial apontou que a atividade contribuiu em 50% para o desenvolvimento da doença, dividindo a causa com uso de motocicleta na vida pessoal. Foi constatado no processo que o fornecimento de EPIS foi insuficiente em alguns anos do período contratual. Na ação, que já tem decisão de segunda instância, o autor ganhou o direito de receber indenização por danos morais no valor de R$ 5 mil, além de R$ 98,7 mil por danos materiais (pensão mensal referente a 7,5% do último salário do reclamante, até ele completar 74 anos de idade. Pagamento arbitrado em parcela única). O percentual de 7,5% foi fixado a partir da consideração de que o trabalho teve 50% de responsabilidade pela perda auditiva que acarretou na redução de 15% da capacidade laboral do autor. A empresa recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho.
Em outra ação, um operador industrial desenvolveu “síndrome do impacto no ombro esquerdo”. Os laudos médico e ergonômico confirmaram que a atividade foi 100% responsável pelo surgimento da doença. Constatou-se que o empregado trabalhava com o braço acima da altura do ombro na maior parte do tempo. Conforme os julgadores, a empresa, também da área fumageira, não comprovou ter adotado mecanismos de segurança eficazes para afastar os riscos decorrentes das atividades. A doença causou redução de 18% da capacidade laboral do operador. Em decisão já confirmada pela 4ª Turma do TRT-RS, ele ganhou direito a uma indenização de R$ 10 mil por danos morais e a uma pensão mensal referente a 18% de seu último salário, enquanto perdurar a incapacidade.
Na avaliação da juíza Luciana, a cultura da prevenção é bem presente em Santa Cruz do Sul, especialmente entre as grandes empresas. Se assim não fosse, a magistrada acredita que o número de casos de doenças e acidentes seria muito maior, dada a intensidade da atividade industrial da região. Em 2017, as Varas do Trabalho de Santa Cruz do Sul receberam 249 processos envolvendo acidentes ou doenças laborais – 1,7% do total de ações que ingressaram com o mesmo tema em todo o Estado. “Os sindicatos patronais e de empregados dialogam sobre o assunto. Percebo que as empresas fornecem e incentivam os uso de EPIs, realizam Sipats (Semanas Internas de Prevenção de Acidentes de Trabalho) e que as Cipas (Comissões Internas de Prevenção de Acidentes de Trabalho) são bem atuantes de forma geral”, afirma a juíza. De acordo com a diretora do Foro Trabalhista, as ações do Programa Trabalho Seguro, desenvolvido pelo TRT-RS em parceria com outras instituições, também ajudam a estimular iniciativas de prevenção na região.
Entretanto, Luciana acredita que os investimentos em prevenção ainda precisam melhorar entre as pequenas e médias e empresas. “Observo que os empregadores de menor porte têm mais dificuldade de executar o PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais) e o PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional)”, afirma a juíza.
Segundo o Observatório Digital de Segurança e Saúde no Trabalho, entre 2012 e 2017 foram notificados 3.034 acidentes ou doenças do trabalho em Santa Cruz do Sul, com 15 óbitos. Nesse mesmo período de seis anos, foram expedidos 954 auxílios-doença por acidente ou doença laboral na cidade. O impacto previdenciário dos afastamentos foi de R$ 7,2 milhões, com a perda de 152.759 dias de trabalho.