7ª Turma do TRT4 considera discriminatória consulta ao Serasa em processos de admissão de empregados
"Impedir um trabalhador que eventualmente poderá ser um excelente profissional tão somente por possuir dívidas implica em não observar a função social do contrato de trabalho, já que se está a negar a única forma de emprego formal dele para saldar com seus compromissos financeiros". Este foi o entendimento da 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) ao determinar que a empresa de transporte de cargas Santo Anjo da Guarda Ltda. deixe de consultar cadastro de devedores (Serasa) nos processos seletivos de admissão de empregados. A reclamada também não pode exigir certidões, atestado ou quaisquer informações creditícias dos candidatos às vagas de emprego, sob pena de multa.
A decisão reforma sentença da juíza Marilene Sobrosa Friedl, da 1ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul. A magistrada de primeiro grau julgou improcedente a ação ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS). Entretanto, para os desembargadores do TRT4, a consulta a banco de dados de inadimplentes caracteriza conduta discriminatória da empresa, já que utiliza a situação econômico-financeira dos trabalhadores para limitar o acesso ao emprego, além de invadir indevidamente a intimidade e a privacidade dos mesmos.
O caso
Ao recorrer da sentença de improcedência da ação, proferida em primeira instância, o MPT-RS sustentou que o conjunto das provas demonstra a conduta ilícita da reclamada nos processos seletivos de admissão de empregados, ao realizar consultas em bancos de dados de terceiros em busca de informações creditícias dos candidatos a vagas de emprego. Como prova dessa conduta, o MPT-RS ressaltou documento presente nos autos, com assinatura e carimbo do responsável pelo recrutamento na empresa, em que consta a reprovação de um trabalhador no processo seletivo sob a justificativa de que este tinha seu nome no cadastro da Serasa.
O MPT-RS também destacou depoimento de preposto da empresa no âmbito do inquérito civil aberto para investigar o caso. Segundo o relato, são as empresas de seguros de carga que exigem que motoristas e ajudantes não estejam com seus nomes em sistemas restritivos de crédito. No entanto, conforme o Ministério, esta condição não ficou demonstrada nos contratos com as empresas seguradoras.
Diante de tais provas, pediu a condenação da reclamada, sob o entendimento de que "a não contratação de trabalhadores porque sobre eles figura alguma inscrição no SERASA é prática de exclusão infundada do mercado de trabalho e, por consequência, de exclusão social, de forma a privilegiar o capital e o lucro em relação a direitos fundamentais conferidos pela Constituição Federal ao trabalhador, como a dignidade, o tratamento sem discriminação, a preservação da sua intimidade e privacidade".
Alegações procedentes
No julgamento do recurso, o relator do acórdão, desembargador Marcelo Gonçalves de Oliveira, afirmou que a prática da empresa afronta os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da não discriminação e dos valores sociais do trabalho. Segundo o magistrado, "não é lógica a conduta da ré de verificar se o seu futuro empregado possui dívidas, porque este é que, na verdade, será o efetivo credor de valores pecuniários da relação empregatícia e não o contrário". Para o julgador, "a ré não tinha motivos jurídicos para efetuar consulta às pendências financeiras de candidatos, o que acarreta evidente ofensa à intimidade e privacidade desses".
Os desembargadores da 7ª Turma, entretanto, negaram a indenização por danos morais coletivos, pleiteada pelo MPT-RS, por considerarem que não houve danos à coletividade, mas somente aos empregados efetivamente reprovados nos processos seletivos. Os prejudicados, conforme explicou o relator, podem buscar individualmente a reparação pelo dano sofrido.