Empregado doméstico
Alessandro Rosa de Almeida; Marcio Seiji Okumura; Nelson Antonio da Silva; Vagner Leandro da Câmara:discentes do 3º semestre do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Santa Fé do Sul.
Ana Cláudia Rodrigues Muller: orientadora, advogada, professora do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Santa Fé do Sul, especialista em Direito Civil, mestre e doutoranda em Processo Civil.
Resumo
O artigo 7º da CLT (Consolidação das Leis do TrabalhoAbre em nova aba), estabelecida pelo decreto-lei nº 5.452 de 1943, estabeleceu expressamente que “os preceitos constantes dapresente Consolidação, salvo quando for, em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam: a) aos empregados domésticos, assim considerados os que prestam serviços de natureza não econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas” (sem destaque no original) [1]. Dessa forma, o empregado doméstico não é regido pela CLT, e sim, por legislação específica, Lei nº5.859 de 11 de dezembro de 1972, regulamentada pelo Decreto nº 71.885 de 9 de março de 1973, que assegurou importantes direitos trabalhistas ao empregado doméstico, conceituando-o em seu art. 1º, como “aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa a pessoa ou a família, no âmbito residencial destas” [2]. Domesticus palavra proveniente do latim significa lar, da casa, da família. Dessa forma para Sérgio Pinto Martins, “o serviço prestado não é apenas no interior da residência, mas pode ser feito externamente, como ocorre com o motorista, desde que, evidentemente, o seja para pessoa ou família”.[3]
Palavras-chave:Empregado doméstico. Lei5.859Abre em nova aba/72. Emenda Constitucional nº72Abre em nova aba. Projeto eSocial.
Sumário:Resumo; Introdução; Direitos constitucionais do empregado doméstico e a Emenda Constitucional nº 72; Obrigações trabalhistas do empregador doméstico e o eSocial; Conclusão; Notas; Referências.
1 Introdução
O presente estudo trata da análise da Emenda Constitucional nº 72. Para sua realização dividiu-se a pesquisa em dois itens, onde o primeiro item tratará sobre os direitos dos empregados domésticos, antes e após o advento da referida emenda, e o segundo irá abordar algumas das novas obrigações trabalhistas ao empregador doméstico estabelecidas pela nova regra, bem como, o eSocial, projeto criado pelo Governo Federal que visa facilitar o cumprimento destas obrigações.
O método de pesquisa é o hipotético-dedutivo e será realizado através de levantamento bibliográfico. Desta forma, pretende-se não esgotar o assunto, mas trazer para discussão os principais aspectos que merecem destaque no atual contexto social e jurídico.
2 Direitos constitucionais do empregado doméstico e a Emenda Constitucional nº 72.
Apesar da Lei nº 5.859/72 estabelecer importantes direitos trabalhistas ao empregado doméstico, este ainda não estava totalmente amparado, uma vez que ainda havia a possibilidade de o doméstico receber remuneração inferior ao salário mínimo, porém, com a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988, foram assegurados ao empregado doméstico alguns dos direitos e garantias dispostos no artigo 7º daConstituição, a saber:
a) salário mínimo;
b) irredutibilidade do salário;
c) décimo terceiro salário;
d) repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;
e) gozo de férias anuais remuneradas;
f) licença a gestante;
g) licença paternidade;
h) aviso prévio proporcional ao tempo de serviço;
i) aposentadoria. [4]
Após a Constituição de 1988, foram ainda assegurados outros direitos ao empregado doméstico pela Lei nº 10.208 de 2001 e pela Lei nº 11.324 de 2006, alterando o texto da Lei nº 5.859/72. Entre esses direitos destacam-se: gozo de folga nos feriados civis e religiosos; estabilidade em razão da gravidez; recolhimento facultativo do FGTS.
A mais recente conquista da categoria dos empregados domésticos foi a aprovação da Emenda Constitucional nº 72, de 2 de abril de 2013; que alterou o parágrafo únicodo art. 7º da Constituição Federal, que passou a vigorar com a seguinte redação:
Parágrafo único: São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VII, VIII, X, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XXI, XXII, XXIV, XXVI, XXX, XXXI e XXXIII e, atendidas as condições estabelecidas em lei e observada a simplificação do cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de trabalho e suas peculiaridades, os previstos nos incisos I, II, III, IX, XII, XXV e XXVIII, bem como a sua integração à previdência social. [5]
Tal alteração constitucional estendeu aos empregados domésticos alguns direitos elencados no art. 7º da Constituição, que antes não se aplicavam à categoria, parte destes direitos independe de regulamentação, outros aguardam regulamentação através de lei específica, cujo projeto ainda está em discussão no Congresso Nacional.
Assim, os direitos assegurados pelo art. 7º da Constituição Federal, com vigência imediata, após a publicação da Emenda Constitucional nº 72, pois independem de regulamentação são: salário mínimo; irredutibilidade desalário; garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; décimo terceiro salário; proteção do salário na forma da lei; duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e 44 horas semanais, facultada a compensaçãode horários e a redução da jornada, mediante acordoou convenção coletiva de trabalho; repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal; gozo de fériasanuais remuneradas com, pelo menos, um terço a maisdo que o salário normal; licença à gestante, sem prejuízo de emprego e do salário; licença paternidade; aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias; redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; aposentadoria; reconhecimento das convenções e acordoscoletivos de trabalho; proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissãopor motivo de sexo, idade, cor, ou estado civil; proibição de qualquer discriminação no tocante a salário ecritérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; proibição de trabalho noturno, perigoso ouinsalubre a menores de dezoito anos; integração à previdência social. [6]
Por outro lado, pertencem ao rol dos direitos que dependem de regulamentação os seguintes: relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa; seguro desemprego, em caso de desemprego involuntário; Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), que até a regulamentação da EC nº 72 é facultativo ao empregador doméstico; remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; salário família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda; assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.[7]
Por se tratar de uma relação de emprego cujo local de trabalho é o ambiente familiar, o que proporciona uma relação de muita confiança entre o empregado e o empregador; nota-se o surgimento de dificuldades na aplicação das regras Constitucionais estendidas a esta relação de emprego pela Emenda Constitucional nº72, entre elas destacam-se:
a) o usufruto do descanso intrajornada: por analogia pode-se estabelecer, até que haja regulamentação específica, que o tempo de descanso para jornada de 8 horas seja de no mínimo uma e no máximo duas horas, no entanto é comum que o trabalhador doméstico abra mão deste descanso por vontade própria, porém, o direito ao descanso é indisponível, assim é dever do empregador concedê-lo sob pena de ter que pagar o período como hora extra em uma possível reclamação trabalhista.
b) hora extra, adicional noturno, trabalho aos sábados e compensação de horários dos empregados que moram ou dormem na residência do empregador: o simples fato de o empregado dormir no local de trabalho não implica necessariamente no trabalho extraordinário, que deverá ser observado somente se o empregado for solicitado durante seu horário de descanso, portanto, nestes casos deve-se manter um rigoroso controle do horário de trabalho, no entanto o grande problema não é a forma de como será feito este controle, e sim, como o juiz trabalhista o aceitará.
3 Obrigações trabalhistasdo empregador doméstico e o eSocial
Até que seja regulamentada a Emenda Constitucional nº 72, é facultativo o recolhimento do FGTS pelo empregador doméstico, porém uma vez efetivada a inclusão do trabalhador doméstico no sistema do FGTS o recolhimento terá caráter irretratável em relação ao respectivo vinculo empregatício. O recolhimento do FGTS é referente a 8% do salário pago ou devido ao empregado doméstico e deverá ser efetuado até o dia 7 de cada mês, devendo ser adiantado para o último dia útil anterior, nos casos em que não houver expediente bancário no dia regulamentado. O empregador que rescindir o contrato de trabalho sem justa causa deverá recolher o percentual de 40% incidente sobre o saldo do FGTS acumulado durante a vigência do respectivo contrato. [8]
Cabe ao empregador doméstico o recolhimento da contribuição à previdência social, no valor referente a 12% do salário contratual, até o dia 15 do mês subsequente, devendo ser também antecipado nos casos em que não houver expediente bancário no dia regular. [9]
No entanto, tais obrigações, entre outras, geram grande dúvida ao empregador doméstico, que nem sempre possui o conhecimento técnico necessário, fazendo com que este procure assistência de um profissional contábil, o que gera despesa ao empregador. Por se tratar de uma relação de emprego onde não há a finalidade econômica esta situação poderá desestimular a formalização da categoria.
Buscando estabelecer a “simplificação do cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de trabalho e suas peculiaridades” [10], o governo federal em uma ação conjunta dos seguintes órgãos e entidades: Secretaria da Receita Federal do Brasil, Ministério da Previdência, Instituto Nacional do Seguro Social, Caixa Econômica Federal, Ministério do Trabalho e Emprego, com o auxílio do Ministério do Planejamento está desenvolvendo o projeto eSocial, que deverá ser disponibilizado até a primeira quinzena de junho de 2013.[11]
O eSocial irá coletar informações inerentes à relação de emprego e armazenará no Ambiente Nacional do eSocial, possibilitando aos órgãos participantes do projeto o livre acesso a elas, contudo o eSocial irá facilitar o cumprimento de algumas obrigações trabalhistas, previdenciárias e fiscais do empregador doméstico, bem como simplificar o recolhimento, que possivelmente deverá ser feito de forma conjunta.
4 Conclusão
O princípio da igualdade está em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais.
O empregado doméstico é um tipo peculiar de empregado, assim como o empregador doméstico não é aquele conceituado no art. 2º da CLT, pois este é pessoa física que contrata o empregado para prestar serviços em sua residência, onde não há finalidade lucrativa, portanto não há de se falar emequiparaçãode direitos entre trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais.
Os novos direitos estendidos ao empregado doméstico pela Emenda Constitucional nº 72 diminuíram a diferença que antes havia entre os trabalhadores domésticos e os demais, porém serão encontradas dificuldades na aplicação de tais regras, devido às peculiaridades da relação de trabalho em questão.
A obrigatoriedade do recolhimento do FGTS pelo empregador doméstico é uma delas, tal regra, ainda a ser regulamentada, deixará a contratação do empregado doméstico mais onerosa, o que poderá inviabilizar este tipo de serviço para inúmeras famílias, que hoje empregam um trabalhador doméstico, podendo gerar desemprego, porém, já é comum a terceirização do trabalho doméstico por empresas especializadas, uma ótima opção para quem necessita destes serviços, mas não podem ou não desejam manter um vínculo de emprego com o trabalhador. Outro problema está no controle das horas trabalhadas, principalmente aos empregados que dormem no local de trabalho. A maneira de como este controle deverá ser feito e de como o juiz irá analisá-lo em uma reclamação trabalhista, somente nos será ensinada após a regulamentação da EC 72 e pela jurisprudência.
Contudo, devemos nos adaptar à nova realidade, buscando de maneira equilibrada solucionar tais problemas, é obvio que inicialmente inúmeras dificuldades deverão ser enfrentadas por ambas as partes.
É certo também que com o tempo a relação jurídica irá se adaptar e se aperfeiçoar proporcionando ao empregado doméstico o reconhecimento de seus direitos na forma da lei.
Notas
[1]Art. 7º da Consolidação das Leis do Trabalho.
[2] Art. 1º da Lei 5.859 de 11 de dezembro de 1972.
[3] Sérgio Pinto Martins, Direito do Trabalho, p.162.
[4] Art. 7º, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988.
[5] Emenda Constitucional nº 72, de 2 de abril de 2013.
[6] Art. 7º, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988.
[7]Art. 7º, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988.
[8] Ministério do Trabalho e Emprego, Trabalho doméstico: direitos e deveres, p. 13.
[9] Ministério do Trabalho e Emprego, Trabalho doméstico: direitos e deveres, p. 22.
[10]Emenda Constitucional nº 72, de 2 de abril de 2013.
[11]Portal do eSocial, Conheça o eSocial.
Referências
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Trabalho doméstico: direitos e deveres.5 ed. Brasília: TEM, SIT, 2013. Disponível em:
co/>. Acesso em 21/04/2014.
BRASIL. Portal do eSocial. Conheça o eSocial. Disponível em:
v. Br/ Conheca. Aspx>. Acesso em 21/04/2014.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 30 ed. São Paulo: Atlas, 2014.