Camareira de hotel tem direito ao adicional de insalubridade em grau máximo
DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO
É devido o adicional de insalubridade (em grau máximo) na limpeza e higienização de quartos e banheiros em hotéis
A realização de serviços de limpeza e higienização, inclusive de banheiros, em hotel, enseja o pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo, nos termos da Súmula nº 448, item II, do TST.
COMENTÁRIOS
Adicional de insalubridade – breves apontamentos
Finalidade
Em determinadas ocasiões o trabalho é prestado em condições desvantajosas ao empregado. Em face disso, a legislação procura “recompensar” ou “retribuir” o trabalhador pelo serviço desempenhado nessas condições.
Segundo José Martins Catharino (1994, p. 278) essas desvantagens podem ser compensadas de dois modos: a) redução do horário de trabalho, aumentando-se, indiretamente o salário; b) imposição do pagamento de uma compensação ao trabalhador mais sujeito a risco.
Em relação ao trabalho noturno, por exemplo, a ordem jurídica nacional adota, conjuntamente, as duas maneiras, já que há uma redução do horário de trabalho (hora ficta) aliada a um adicional salarial (adicional noturno).
Por outro lado, em relação ao adicional de insalubridade, a legislação prevê apenas um acréscimo salarial (item b acima), relegando a plano secundário o aspecto fisiológico da insalubridade (CATHARINO, 1994, p. 278).
Conceito
Pode-se conceituar o adicional de insalubridade como a parcela de natureza salarial e, portanto, contraprestativa, paga em razão de trabalho prestado em condições insalubres, assim entendidas aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.
Natureza Jurídica
Trata-se de salário condição. Tem natureza salarial, nos termos da súmula nº 139 do TST:
Súmula nº 139 – ADICIONAL DE INSALUBRIDADE.
Enquanto percebido, o adicional de insalubridade integra a remuneração para todos os efeitos legais.
É, pois, salário, já que se trata de parcela contraprestativa, ou seja, paga-se um plusem virtude do desconforto ou desgaste vivenciado, não tendo natureza indenizatória, conforme entendimento majoritário na doutrina e jurisprudência (DELGADO, 2014, p. 789).
Ao termo salário acrescenta-se o designativo “condição” porque existe uma situação específica que dá ensejo ao seu recebimento. Quando a condição se verifica, existe o fato gerador do pagamento do salário. Cessada a situação fática – a condição – que dava ensejo ao recebimento do salário, cessa também o pagamento.
Desse modo, a percepção do adicional de insalubridade depende da exposição do empregado a agentes nocivos à sua saúde acima dos limites de tolerância fixados pelo órgão competente. Eliminado o agente insalubre, o empregado não mais faz jus ao respectivo adicional, uma vez que este possui natureza de salário-condição. Dessa forma, a reiteração em seu pagamento constitui liberalidade do empregador.
Sobreleva esclarecer que é necessária a classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo MTE, não bastando a constatação por laudo pericial, nos exatos termos do item I, da Súmula 448 do TST, verbis:
Súmula 448 do TST. ATIVIDADE INSALUBRE. CARACTERIZAÇÃO. PREVISÃO NA NORMA REGULAMENTADORA Nº 15 DA PORTARIA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO Nº 3.214/78. INSTALAÇÕES SANITÁRIAS.
I - Não basta a constatação da insalubridade por meio de laudo pericial para que o empregado tenha direito ao respectivo adicional, sendo necessária a classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho. [...]
Igualmente, se houver reclassificação ou descaracterização da insalubridade, por ato da autoridade administrativa competente, esse fato irá repercutir na satisfação do respectivo adicional, sem ofensa ao direito adquirido ou ao princípio da irredutibilidade salarial. É o que dispõe a Súmula 248 do TST:
Súmula 248 do TST. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. DIREITO ADQUIRIDO.
A reclassificação ou a descaracterização da insalubridade, por ato da autoridade competente, repercute na satisfação do respectivo adicional, sem ofensa a direito adquirido ou ao princípio da irredutibilidade salarial.
Classificação dos graus de insalubridade
O exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional respectivamente de 40% (quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento) do salário-mínimo da região, segundo se classifiquem nos graus máximo,médio e mínimo (art. 192Abre em nova aba da CLTAbre em nova aba).
Eliminação ou a neutralização da insalubridade
A eliminação ou a neutralização da insalubridade ocorrerá com a adoção de medidas que conservem o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância; ou com a utilização de equipamentos de proteção individual ao trabalhador, que diminuam a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância. (art. 191, CLT)
Base de Cálculo ou de Incidência do adicional de insalubridade[1]Abre em nova aba
Em um breve histórico das recentes decisões sobre o tema, Marco Túlio Viana (2014, p. 116-117) bem resume a situação:
A CLT diz ainda que o adicional de insalubridade [...] deve ser pago à base de 10, 20 ou 40% sobre o “salário mínimo”. Era o que repetia a Súmula nº 228 do TST, completada pela de nº 17 (que ressalvava a hipótese do salário profissional).
No entanto, ao interpretar, recentemente o art. 7º, inc. IV, da Constituição, o STF concluiu: “Súmula Vinculante nº 4 do STF. Salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial.”
Em face disso, o TST revogou a Súmula nº 17 e alterou nos seguintes termos a redação da Súmula nº 228: “ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. A partir de 9 de maio de 2008, data da publicação da Súmula Vinculante nº 4 do Supremo Tribunal Federal, o adicional de insalubridade será calculado sobre o salário básico, salvo critério mais vantajoso fixado em instrumento coletivo.”
Todavia, a Confederação Nacional das Indústrias – CNI – interpôs reclamação perante o STF com pedido de liminar contra o ato do TST que alterou a redação da Súmula nº 228. De acordo com as alegações da CNI, a nova redação estaria violando a Súmula Vinculante nº 4, que também impede a substituição da base de cálculo por meio de decisão judicial.
A liminar foi concedida pelo Ministro Gilmar Mendes em 15.7.2008, suspendendo a aplicação do salário básico para calcular o adicional de insalubridade. Em razão disso, a dúvida continuou: qual seria então a base de cálculo?
Atualmente a jurisprudência do TST se inclina pelo salário mínimo, até que sobrevenha lei ou convenção coletiva em sentido contrário.
Portanto, conforme a jurisprudência consolidada no STF, antes ou depois da edição da Súmula Vinculante nº 4, o salário mínimo continua a ser a base de cálculo do adicional de insalubridade (art. 192 da CLT), até que nova base seja determinada mediante lei ou norma coletiva específica.
Esse também é também, como se viu, o posicionamento mais recente do TST, que se inclina pelo salário mínimo, até que sobrevenha lei ou convenção coletiva em sentido contrário (VIANA, 2014, p. 117).
Em resumo, a base de cálculo para o adicional de insalubridade atualmente é o SALÁRIO MÍNIMO, ATÉ QUE SOBREVENHA LEI OU CONVENÇÃO COLETIVA EM SENTIDO CONTRÁRIO.
Pode haver acumulação dos adicionais e insalubridade e de periculosidade?
Em decisão recente a 7ª turma do TST entendeu possível a acumulação entre os adicionais de insalubridade e de periculosidade, em que pese a literalidade do art.193, § 2º da CLT, pelo qual “o empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido”.
Eis a ementa da decisão:
RECURSO DE REVISTA. CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE. PREVALÊNCIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E SUPRALEGAIS SOBRE A CLT. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO STF QUANTO AO EFEITO PARALISANTE DAS NORMAS INTERNAS EM DESCOMPASSO COM OS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. INCOMPATIBILIDADE MATERIAL. CONVENÇÕES NOS 148 E 155 DA OIT. NORMAS DE DIREITO SOCIAL. CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE. NOVA FORMA DE VERIFICAÇÃO DE COMPATIBILIDADE DAS NORMAS INTEGRANTES DO ORDENAMENTO JURÍDICO. A previsão contida no artigo 193, § 2º, da CLT não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, que, em seu artigo 7º, XXIII, garantiu de forma plena o direito ao recebimento dos adicionais de penosidade, insalubridade e periculosidade, sem qualquer ressalva no que tange à cumulação, ainda que tenha remetido sua regulação à lei ordinária. A possibilidade da aludida cumulação se justifica em virtude de os fatos geradores dos direitos serem diversos. Não se há de falar em bis in idem. No caso da insalubridade, o bem tutelado é a saúde do obreiro, haja vista as condições nocivas presentes no meio ambiente de trabalho; já a periculosidade traduz situação de perigo iminente que, uma vez ocorrida, pode ceifar a vida do trabalhador, sendo este o bem a que se visa proteger. A regulamentação complementar prevista no citado preceito da Lei Maior deve se pautar pelos princípios e valores insculpidos no texto constitucional, como forma de alcançar, efetivamente, a finalidade da norma. Outro fator que sustenta a inaplicabilidade do preceito celetista é a introdução no sistema jurídico interno das Convenções Internacionais nos 148[2]Abre em nova aba e 155[3]Abre em nova aba, com status de norma materialmente constitucional ou, pelo menos, supralegal, como decidido pelo STF. A primeira consagra a necessidade de atualização constante da legislação sobre as condições nocivas de trabalho e a segunda determina que sejam levados em conta os “riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes”. Nesse contexto, não há mais espaço para a aplicação do artigo 193, § 2º, da CLT. Recurso de revista de que se conhece e a que se nega provimento."(TST, 7ª T., RR - 1072-72.2011.5.02.0384, Rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 03.10.2014). (grifou-se)
E se for o trabalho executado em exposição a dois agentes insalubres?
O TST sustenta que os adicionais não se cumulam quando o empregado esteja exposto a mais de um agente nocivo. Veja que a situação é diferente do item anterior (adicional de insalubridade cumulado com adicional de periculosidade). Aqui se trata de adicional de insalubridade cumulado com adicional de insalubridade.
Na esteira dessa compreensão, o item 15.3 da Norma Regulamentadora 15 do Ministério do Trabalho estabelece: “No caso de incidência de mais de um fator de insalubridade, será apenas considerado o de grau mais elevado, para efeito de acréscimo salarial, sendo vedada a percepção cumulativa”.
Vólia Bonfim e Alice Monteiro de Barros criticam fortemente esse posicionamento, ao argumento de que se o adicional visa indenizar a nocividade do trabalho executado, se as nocividades são múltiplas, os adicionais também deveriam ser. Ademais, não há obstáculo criado pela lei nesse aspecto. Caso a decisão acima transcrita se torne majoritária, por certo deverá também ser aceita a percepção cumulada de dois ou mais adicionais de insalubridade.
O caso concreto
§ A limpeza de quartos de hotel e a respectiva coleta de lixo é atividade insalubre?
Imprescindível a análise do item II da Súmula 448 do TST:
Súmula 448 do TST – ATIVIDADE INSALUBRE. CARACTERIZAÇÃO. PREVISÃO NA NORMA REGULAMENTADORA Nº 15 DA PORTARIA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO Nº 3.214/78. INSTALAÇÕES SANITÁRIAS.
[...]
II – A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/78 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano. (grifou-se)
Para que se responda a indagação acima, outro questionamento deve ser feito: a atividade de camareira de hotel é realizada em instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação?
O TST entendeu que sim, razão pela qual considerou a atividade insalubre.
No caso concreto a Reclamante realizava a limpeza e higienização de banheiros e coleta de lixo sanitário no estabelecimento da Reclamada (empresa do setor hoteleiro).
A prova pericial concluiu que “ao efetuar a limpeza das instalações sanitárias, incluindo vaso, pia, parede, bem como ao coletar os papéis servidos, a autora estava exposta a ação de agentes biológicos nocivos à saúde; que as atividades realizadas pela autora eram insalubres em grau máximo, nos termos do Anexo 14 da NR-15 da Portaria 3.214/78, do MTE”.
Em segunda instância, o Tribunal Regional entendeu que
considerando-se que o lixo, coletado em sanitários não difere em nada, qualitativamente, daquele coletado nas vias públicas, podendo ser apontado como uma subespécie do"lixo urbano", ao qual se refere, expressamente, a norma regulamentadora, e tendo em vista que a exposição aos agentes patogênicos, geradores do direito à percepção do sobre-salário no percentual máximo, está demonstrada, mantém-se a decisão de origem, que condena a reclamada ao pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, com reflexos.
Seguindo o mesmo entendimento do Regional, o TST entendeu que as funções desempenhadas pela reclamante não consistiam na mera limpeza de banheiros privados, equiparáveis ao ambiente doméstico ou de escritórios, mas eram desempenhadas, de modo habitual e permanente, em local com circulação de grande número de pessoas, diariamente.
No caso específico dos autos, a reclamante ativava-se na limpeza de quartos, banheiros e na coleta de lixo em hotel de grande circulação de pessoas, de procedência diversa, situação que se amolda perfeitamente na previsão do Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/78, não se podendo confundir a situação vivenciada pela empregada no exercício de suas atividades com a hipótese de limpeza em residências e escritórios.
Votos vencidos
Vencidos os Ministros Renato de Lacerda Paiva, Aloysio Corrêa da Veiga, Guilherme Augusto Caputo Bastos e Brito Pereira, que negavam provimento ao apelo por entenderem que a atividade desempenhada pela reclamante não se enquadra nos critérios de “uso público ou coletivo de grande circulação”, previstos no item II da Súmula nº 448 do TST.
EMENTA DA DECISÃO
RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº11.496/2007. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. LIMPEZA DE QUARTOS E COLETA DE LIXO. HOTELARIA. Súmula n.º 448, item II, desta Corte superior.
1. “A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/78 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano” (Súmula n.º 448, item II, desta Corte superior).
2. Constatado nos autos que a reclamante realizava serviços de limpeza e higienização, inclusive de banheiros, em hotel de grande circulação de pessoas, resulta devida a condenação ao pagamento do adicional de insalubridade.
3. Recurso de embargos conhecido e provido.
SÚMULAS
Súmula 448 do TST – ATIVIDADE INSALUBRE. CARACTERIZAÇÃO. PREVISÃO NA NORMA REGULAMENTADORA Nº 15 DA PORTARIA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO Nº 3.214/78. INSTALAÇÕES SANITÁRIAS.
I - Não basta a constatação da insalubridade por meio de laudo pericial para que o empregado tenha direito ao respectivo adicional, sendo necessária a classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho.
II – A higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, enseja o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, incidindo o disposto no Anexo 14 da NR-15 da Portaria do MTE nº 3.214/78 quanto à coleta e industrialização de lixo urbano.
ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS
Não há OJs relacionadas diretamente ao caso julgado.
REFERÊNCIAS LEGISLATIVAS
Art. 189 da CLT – Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.
Art. 190 da CLT – O Ministério do Trabalho aprovará o quadro das atividades e operações insalubres e adotará normas sobre os critérios de caracterização da insalubridade, os limites de tolerância aos agentes agressivos, meios de proteção e o tempo máximo de exposição do empregado a esses agentes.
Parágrafo único - As normas referidas neste artigo incluirão medidas de proteção do organismo do trabalhador nas operações que produzem aerodispersóides tóxicos, irritantes, alérgicos ou incômodos.
BIBLIOGRAFIA RELACIONADA
CATHARINO, José Martins. Tratado jurídico do salário. São Paulo: LTr, 2004.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 13. Ed. São Paulo: LTr, 2014.
VIANA, Marcio Túlio. Para entender o salário. São Paulo: LTr, 2014.