Inovação Legislativa: Considerações acerca da Lei do Mandado de Injunção (Lei nº. 13.300/16).
INTRODUÇÃO
O Mandado de Injunção é um remédio constitucional (art. 5º, LXXI) que tem por fito suprir omissão legislativa; “curar” a denominada “síndrome da inefetividade das normas constitucionais”. Não raras vezes algum direito contemplado pela “Carta Magna” encontra-se com seu exercício afetado em decorrência da inexistência de norma regulamentadora, é nesta senda, que reside à razão de ser da ação constitucional em tela.
Em junho do ano corrente fora sancionada a Lei que disciplina o processamento e julgamento do Mandado de Injunção Individual e Coletivo (Lei nº. 13.300/16), a qual fez florescer significativas mudanças na sua condução. Há de se ressaltar que antes da edição da novel legislação, a ação em apreço era regulada pelo entendimento jurisprudencial consolidado do STF, bem como pela utilização da Lei do Mandado de Segurança (Lei nº. 12.016/09).
1. DA FINALIDADE
Em linhas gerais, ao tratar do escopo desta garantia constitucional, a legislação em análise, assegura que será passível de Mandado de Injunção a omissão legislativa integral ou até mesmo parcial. Ora, não existindo norma regulamentadora, ou caso exista não seja capaz de concretizar o comando constitucional, caberá o remédio em deslinde.
É essa a lição do art. 2º, parágrafo único da lei, vejamos:
Art. 2º Conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta total ou parcial de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
Parágrafo único. Considera-se parcial a regulamentação quando forem insuficientes as normas editadas pelo órgão legislador competente.
2. DA LEGITIMIDADE
Quanto à parte legítima para impetrar o Mandado de Injunção, vê-se que o arcabouço legal em comento define de forma categórica (art. 3º). São legitimadas, na condição de impetrante, as pessoas naturais ou jurídicas (pessoa jurídica também é destinatária de diretos e garantias fundamentais) que se sintam prejudicadas pela não contemplação de um direito constitucional previsto em decorrência da ausência de norma concretista. Nesse sentido, imprescindível trazer a tona o que preconiza a lei:
Art. 3o São legitimados para o mandado de injunção, como impetrantes, as pessoas naturais ou jurídicas que se afirmam titulares dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas referidos no art. 2o e, como impetrado, o Poder, o órgão ou a autoridade com atribuição para editar a norma regulamentadora.
Indispensável suscitar que o legislador em apenas um único dispositivo, estabelece, de maneira paralela, quem será o impetrado (legitimidade passiva), o que se vislumbra que nunca será o particular, em virtude da sua incapacidade de inovar na ordem jurídica normativa.
3. DA PROCEDÊNCIA DA INJUNÇÃO
Em sendo deferido o pleito, será determinado que o órgão responsável, em prazo razoável, edite a norma regulamentadora e que seja fixado os ditames para o exercício do direito.
O art. 8º da respectiva legislação é categórico, portanto, vejamos:
Art. 8º Reconhecido o estado de mora legislativa, será deferida a injunção para:
I - determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma regulamentadora;
II - estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados ou, se for o caso, as condições em que poderá o interessado promover ação própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no prazo determinado.
Parágrafo único. Será dispensada a determinação a que se refere o inciso I do caput quando comprovado que o impetrado deixou de atender, em mandado de injunção anterior, ao prazo estabelecido para a edição da norma.
Sob o meu prisma o legislador, nesta senda, não foi tão feliz, pois, não definiu limites para esse “prazo razoável”, deixando uma margem muito ampla para interpretação. Ao revés disto, há de se esclarecer a sua postura acertada em dispensar a fixação de tal prazo nos casos de reincidência da mora legislativa, consoante se verifica do parágrafo único.
4. DOS EFEITOS
Doutro ponto, fundamental elucidar que a novel legislação trouxe como regra a adoção da teoria denominada pela suprema corte de “Concretista Individual”, ao afirmar que os efeitos da decisão da injunção tem o caráter subjetivo limitado às partes. Vejamos o art. 9º caput:
Art. 9º A decisão terá eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos até o advento da norma regulamentadora.
Esclarece-se, contudo, que há possibilidade, ainda que de forma excepcional, da eficácia “erga omines” (para todos), quando indispensável para o exercício do direito, fazendo emergir, dessa maneira, a chamada teoria "Concretista Geral".
Ademais, fundamental externar que, havendo trânsito em julgado da decisão da injunção, o relator, por intermédio de decisão monocrática, poderá estender a casos que demonstram similitude ao que foi adotado (art. 9º, § 2º), privilegiando, dessa maneira a economicidade e celeridade processual, pressupostos valorados pelo novo modelo constitucional de processo.
Noutro ponto, urge declinar, que caso seja indeferido o pleito em virtude da fragilidade de provas não incidirá a coisa julgada material, podendo haver nova impetração, caso seja colacionado novo contexto probatório, essa lição se deduz do § 3º do art. 9º.
5. DA AÇÃO DE REVISÃO
Sob o enfoque da nova lei do Mandado de Injunção, vislumbra-se que, proferida decisão, esta poderá ser revista a requerimento do interessado, razão em que terá que se incumbir do ônus de demonstrar circunstâncias fáticas e jurídicas que ensejem a alteração do que fora exarado outrora. Vejamos o que reza o art. 10 da legislação em apreço:
Art. 10. Sem prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá ser revista, a pedido de qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações das circunstâncias de fato ou de direito.
Parágrafo único. A ação de revisão observará, no que couber, o procedimento estabelecido nesta Lei.
Atente-se que a referida ação observará, concomitantemente, a legislação processual vigente.
6. A NORMA REGULAMENTADORA E SUA EFICÁCIA TEMPORAL
A norma concretista terá efeitos prospectivos (“ex nunc”), a não ser que seja mais favorável a situação, fato em que produzirá efeitos retroativos (“ex tunc”). Demais disso, fundamental destacar, que poderá ocorrer perda do objeto quando a edição da norma preceder a decisão da ação constitucional, consoante se verifica do art. 11, parágrafo único.
Art. 11. A norma regulamentadora superveniente produzirá efeitos ex nunc em relação aos beneficiados por decisão transitada em julgado, salvo se a aplicação da norma editada lhes for mais favorável.
Parágrafo único. Estará prejudicada a impetração se a norma regulamentadora for editada antes da decisão, caso em que o processo será extinto sem resolução de mérito.
7. DO MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO
Aqui reside uma das inovações mais relevantes trazidas pela lei nº.13.300/16, pois, em decorrência de não haver legislação que tratasse de maneira específica do referido remédio, o seu manejo era criação do Supremo Tribunal Federal (STF).
Antes da edição da novel legislação, os legitimados para impetração do Mandado de Injunção Coletivo, eram os mesmos do Mandado de Segurança Coletivo, quais sejam, partidos políticos (com representação no Congresso Nacional), os sindicatos, as entidades de classe e as associações legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.
Esclarece-se, no entanto, que com criação da legislação específica disciplinadora do Mandado de Injunção, a Defensoria Pública bem como o Ministério Público também são legitimados para impetração do Mandado de Injunção Coletivo (além dos acima mencionados), vejamos:
Art. 12. O mandado de injunção coletivo pode ser promovido:
I - pelo Ministério Público, quando a tutela requerida for especialmente relevante para a defesa da ordem jurídica, do regime democrático ou dos interesses sociais ou individuais indisponíveis;
II - por partido político com representação no Congresso Nacional, para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas de seus integrantes ou relacionados com a finalidade partidária;
III - por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas em favor da totalidade ou de parte de seus membros ou associados, na forma de seus estatutos e desde que pertinentes a suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial;
IV - pela Defensoria Pública, quando a tutela requerida for especialmente relevante para a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5oda Abre em nova abaConstituição Federal.
Parágrafo único. Os direitos, as liberdades e as prerrogativas protegidos por mandado de injunção coletivo são os pertencentes, indistintamente, a uma coletividade indeterminada de pessoas ou determinada por grupo, classe ou categoria.
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nessa esteira, portanto, diante da análise avençada, vê-se que a inovação legislativa representa um marco deveras relevante para a República, tendo em vista que o Mandado de Injunção fora consagrado pela Constituição de 1988 e desde desta data faltava-lhe uma ordem disciplinadora. Demais disso, há de se ressaltar que a jurisprudência já consolidada pela suprema corte no tocante ao remédio constitucional em apreço, ganhou base legal com a instauração da respectiva ordem normativa, tendo, dessa maneira, uma certa vinculação.
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 11ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016.