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Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região

Escola Judicial

Publicada em: 06/12/2016 00:00. Atualizada em: 06/12/2016 00:00.

Efetividade dos Direitos Sociais e a reserva do possível

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Início do corpo da notícia.

Meus amigos, um tema que não é novo, mas que vem sendo reiteradamente cobrado em concursos públicos e objeto de diversos TCC's, é o da “efetividade dos direitos sociais e a reserva do possível”.

Ninguém duvida, na atual quadra jurídico-constitucional, que os direitos sociais, por se revestirem de intensa fundamentalidade jurídica, vinculam o Estado, cujos agentes (legisladores, governantes e juízes) têm o dever de respeitá-los, promovê-los e concretizá-los.

Sucede, porém, que muito se tem discutido a respeito dos “custos” decorrentes da efetivação desses direitos, ao ponto de inúmeros autores (não são poucos) associarem a concretização dos direitos sociais à prévia disponibilidade financeira do Estado, a partir do argumento da reserva do possível.

Buscaremos, aqui, esclarecer melhor essa questão, obviamente sem a pretensão de exaurir o debate. Vamos lá.

O argumento da reserva do possível teve origem na Alemanha, no início da década de 70, em conhecida decisão do Tribunal Constitucional Federal Alemão (Bundesverfassungsgericht), proferida em 18 de julho de 1972, no caso “numerus clausus” (BVerfGE 33, 303), em que se discutiu o direito de acesso ao ensino superior e a limitação do número de vagas nas universidades públicas alemãs. Sabe-se do caso, que alguns estudantes que não foram admitidos em universidades de medicina de Hamburgo e Munique em razão da política de limitação de vagas (por isso o nome, “numerus clausus”) em cursos superiores, imposta pela Alemanha na época, ingressaram com ações judiciais, invocando o art. 12 da Lei Fundamental Alemã, segundo o qual “todos os alemães têm direito a escolher livremente sua profissão, local de trabalho e seu centro de formação”. Reconheceu a Corte Alemã que o direito de escolha de profissão (art. 12), associado aos princípios da igualdade (art. 3º) e do Estado Social (art. 20), conduz inegavelmente ao direito de acesso às instituições de ensino.

Entretanto, não obstante o reconhecimento da existência do direito de acesso ao ensino superior, decidiu o Tribunal que “a pretensão dos estudantes não se mostrava razoável perante a sociedade”. Isto é, construindo a teoria da reserva do possível, o Tribunal Alemão firmou o entendimento de que o cidadão só poderia exigir do Estado e, por consequência, da sociedade, aquilo que razoavelmente se pudesse esperar; quer dizer, “só é possível exigir aquilo que estiver dentro dos limites do razoável”, de modo que, no caso dos estudantes, o Bundesverfassungsgericht considerou “não ser razoável esperar do Estado o oferecimento de vagas ilimitadas para o curso de medicina”.

Percebe-se que, na sua origem, a reserva do possível “não se relaciona à existência de recursos materiais e financeiros”, necessários para a efetivação dos direitos sociais, mas, sim, à razoabilidade da pretensão das pessoas perante o Estado e à sociedade.

Ocorre, entretanto, que no Brasil a teoria da reserva do possível foi mal interpretada e passou a ser utilizada como fundamento econômico e financeiro, associada à insuficiência de recursos públicos, como forma de justificar a omissão do poder público no cumprimento de sua obrigação constitucional no campo dos direitos sociais, o que, efetivamente, revela um absurdo. De fato, a doutrina brasileira vem entendendo que a efetividade dos direitos sociais depende da disponibilidade dos respectivos recursos públicos necessários para a satisfação das prestações materiais que constituem seu objeto (saúde, educação, assistência, etc.).

Sem embargo dos aspectos referentes à sua origem (no caso conhecido comonumerus clausus), a chamada reserva do possível foi desenvolvida na Alemanha num contexto jurídico e social totalmente distinto da realidade histórico-concreta brasileira. Diferente da Alemanha, onde o “mínimo existencial” de há muito foi assegurado, no Brasil as promessas do Estado do bem-estar sequer foram concretizadas. Por essa razão, invocar a reserva do possível como fundamento econômico para justificar a inação do Estado em uma sociedade expressivamente desigual e repleta de miseráveis, onde não há um mínimo de existência digna garantido, não se coaduna com o discurso constitucional brasileiro.

A propósito, paradigmática foi a decisão do em. Ministro Celso de Mello na ADPF nº 45. Com efeito, reconheceu o Ministro Celso de Mello, inicialmente, a possibilidade do controle judicial de políticas públicas como modo de efetivação dos direitos sociais, quando quedarem-se inertes os órgãos de direção política (do Legislativo e do Executivo), que deixam de cumprir os seus deveres constitucionais de implementação daqueles direitos. Logo em seguida, enfrentando com maestria o tema referente à “reserva do possível”, considerou que o Estado não pode invocá-la “com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade”.

Nesse contexto, a conclusão a que se chega é que a reserva do possível só se justifica e pode ser invocada quando o Estado já tenha garantido a existência digna de todos (o “mínimo existencial”). Fora desse quadro, tem-se a desconstrução do Estado Constitucional de Direito, com a total frustração das legítimas expectativas da sociedade.

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Um forte abraço e fiquem com Deus.

Dirley da Cunha Júnior

Professor do Brasil Jurídico - Ensino de Alta Performance

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Fonte: www.jusbrasil.com.br, acesso em 23 de novembro de 2016
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