Grupo de estudos do TRT-RS aprova novo enunciado sobre violência e assédio no mundo do trabalho

O grupo de estudos “OIT e Trabalho Decente”, do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS), aprovou um novo enunciado em reunião realizada na última semana. O tema é a “Violência e o Assédio no Mundo do Trabalho”, com base na Convenção nº 190 e na Recomendação nº 206, ambas da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Na videoconferência, dirigida pela coordenadora do grupo, juíza Carolina Cauduro Dias de Paiva, participaram os magistrados: Lúcia Matos, Gabriela Lacerda, Barbara Fagundes, Rachel Mello, Luciana Kruse, Milena Ody, Silvionei do Carmo, Caroline Colombo, Rafael Marques e Adriana Kunrath.
Os cinco enunciados já aprovados pelo grupo abordam diferentes temas como a crise climática, a aplicação do direito internacional do trabalho, a eliminação da discriminação nos empregos e ocupações e o trabalho de igual valor. Os textos estão disponíveis neste link.
Confira, a seguir, o novo enunciado:
“Violência e Assédio no Mundo do Trabalho
I - A Convenção nº 190 e a Recomendação nº 206 da OIT podem orientar a interpretação dos juízes e das juízas do trabalho em casos envolvendo violência e assédio no mundo do trabalho. Nesse sentido, o artigo 8º da CLT permite a aplicação de princípios e normas gerais de direito, especialmente em temáticas como violência e assédio em que não há regulamentação geral e específica no direito do trabalho (Enunciado 2, item V).
II – O assédio sexual e outras formas de assédio estão incluídos na definição de discriminação direta, conforme o art. 1º da Convenção nº 111 da OIT, ratificada pelo Brasil (Decreto nº 104, de 26 de maio de 1965), com status supralegal (STF, RE 466.343/SP). (Fonte: Organização Internacional do Trabalho. Giving Globalization a Human Face, 2012, §§ 743 a 746 e 748)
III – O assédio sexual constitui uma forma grave de discriminação baseada no sexo ou no gênero e uma violação de direitos humanos. Pode se manifestar de duas formas principais:
- Assédio por chantagem sexual (quid pro quo): ocorre quando uma conduta de natureza sexual – física, verbal ou não verbal – é usada, de forma explícita ou implícita, como condição para a obtenção, manutenção ou progressão no emprego, ou para evitar prejuízos profissionais.
- Assédio ambiental ou criação de ambiente hostil: consiste em comportamentos indesejados e ofensivos, que se repetem ou são particularmente graves, e que criam um ambiente de trabalho intimidante, hostil ou humilhante para a vítima.
Ambas as formas violam a dignidade da pessoa trabalhadora e devem ser combatidas com base nos princípios de igualdade e não discriminação. (Fonte: Organização Internacional do Trabalho. Giving Globalization a Human Face, 2012, § 789)
IV – É compatível com o ordenamento jurídico brasileiro a concepção adotada pela Convenção nº 190 da OIT, segundo a qual violência e assédio no mundo do trabalho compreendem “um conjunto de comportamentos e práticas inaceitáveis, ou de ameaças desses comportamentos e práticas, de ocorrência única ou repetida, que visem, causem ou sejam suscetíveis de causar dano físico, psicológico, sexual ou econômico”, incluindo a violência e o assédio com base no gênero (art. 1º, alínea “a”). Assim, a caracterização do assédio pode decorrer de ato único e não exige prova de dano efetivo.
V – A proteção conferida pela Convenção nº 190 e pela Recomendação no 206 é ampla e se estende para além das pessoas empregadas (art. 2º), alcançando todos os trabalhadores e trabalhadoras, independentemente do vínculo contratual, seja na economia formal ou informal, e tanto no setor público quanto no privado. A formulação abrangente permite a inclusão de pessoas em formas de trabalho atípicas, autônomas, em domicílio, em plataformas digitais e em ambientes virtuais.
VI – A Convenção nº 190 e a Recomendação nº 206 reconhecem que atos de violência e assédio não precisam ocorrer exclusivamente em locais físicos tradicionais de trabalho para serem considerados condutas vedadas. Diante da multiplicidade de ambientes e modalidades em que o trabalho se desenvolve – inclusive por meio de tecnologias –, esses instrumentos garantem proteção a todas as situações relacionadas ao trabalho (art. 3º da Convenção nº 190).
VII – Considerando que pessoas trabalhadoras pertencentes a grupos vulnerabilizados são afetadas de maneira desproporcional por situações de violência e assédio, é imprescindível que os processos que tratam da matéria sejam conduzidos com uma abordagem antidiscriminatória, interseccional e inclusiva.
VIII – Em casos de violência e assédio, deve-se adotar uma abordagem “inclusiva, integrada e sensível ao gênero” (art. 4ª da Convenção nº 190), com a implementação de medidas processuais aptas a garantir o acesso à justiça. Entre elas, destaca-se a possibilidade de inversão do ônus da prova em ações trabalhistas envolvendo violência e assédio com base no gênero, incluindo o assédio sexual (art. 16 da Recomendação nº 206).
IX – Compete a magistradas e magistrados do trabalho reconhecer os efeitos da violência doméstica nas relações de trabalho e, sempre que possível e razoável, adotar medidas para mitigar seu impacto sobre a vida profissional da vítima (art. 10 da Convenção nº 190 e art. 18 da Recomendação nº 206)”.